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Por Henrique Packter 09/11/2020 - 17:33 Atualizado em 09/11/2020 - 17:33

Os mais antigos moradores de Santa Maria foram os índios Minuanos. Italianos, alemães, portugueses, espanhóis, indígenas e negros escravos chegam depois e também compõem as etnias que originaram a população da cidade. A lenda indígena da origem do município conta com o bandeirante Morotin que se casa com a índia Imembuí, da tribo dos Minuanos..

Às margens do Arroio També conviviam em paz duas tribos, Tapes e Minuanos, estes habitando região do município conhecida como Coxilha do Pau Fincado - mais para a região da campanha. Os Tapes, em maior número, viviam para os lados da serra.

O lugar era chamado pelos índios de Ybitory-Retan (terra da alegria). Ibotiquintã, esposa do cacique dos Minuanos, deu à luz menina que chamou de Ymembuí (filha das águas). Mais tarde, mocinha, Imembuy passa a ser assediada pela rapaziada  e um destes jovens índios, Acangatú, rejeitado pela beldade, abandona a tribo.

É quando chega tropa de bandeirantes portugueses para demarcar fronteiras que é emboscada e dizimada pelos Minuanos. Os índios poupam apenas dois sobreviventes. Um deles é mandado de volta para contar a desgraça ocorrida com os demais; Rodrigues, o outro, seria sacrificado, em ritual sangrento.

Rodrigues, depois Morotin deve escolher: ou casa, ou morre

Escolhe casar, claro. Rodrigues era português, mas não tanto assim. Conquistando  e casando com Imembuy livra-se da morte. Rodrigues recebe, então, nome indígena, Morotin. Tiveram um filho, José, que, brincando, perde-se na mata, sendo salvo pelo desaparecido Acangatú que se decide por retornar à tribo.

Portugal e Espanha firmam tratado, acordando a devolução de terras ocupadas ilegalmente por ambas as partes (Tratado Preliminar de Restituições Recíprocas, 1777). Em 1787, comissão de espanhóis e portugueses, passa pela região e divide o território em sesmarias. Francisco de Amorim recebe gleba onde hoje se situa a cidade, depois comprada pelo Pe. Ambrosio José de Freitas.

O acampamento da comissão demarcadora de limites entre terras de domínio espanhol e português, cria a cidade (1797). O engenheiro e astrônomo José Saldanha Marinho chefiava a comissão demarcadora. Desentendimentos relativos aos limites dos dois territórios e desavença com o comissário espanhol, D. Diogo de Albear (1797), faz a 2ª Subdivisão Demarcadora, comandada pelo Cel Francisco João Róscio, retornar a Santa Maria. A comissão monta acampamento onde hoje está a Praça Saldanha Marinho e a Rua do Acampamento. Esta, fica conhecido por Acampamento de Santa Maria e, mais tarde, Acampamento de Santa Maria da Boca do Monte, nome dado pelos espanhóis, por ficar na entrada da serra que leva a São Martinho.

Assim, a Rua do Acampamento surge no local dos ranchos dos demarcadores. Depois vem a Rua Pacifica, atual Dr. Bozano, a mais importante artéria comercial da cidade e que levava ao Passo da Areia. O 28º Batalhão de Estrangeiros chega para lutar na Guerra Cisplatina (1828). Em 17.11.1837 Santa Maria passou a freguesia e a praça era a Praça da Matriz. Intensifica-se o povoamento da região, muitos militares optam por ficar na freguesia após baixa da tropa. Colonos vindos das bandas de São Leopoldo iniciam o ciclo da colonização alemã. Santa Maria, elevada à condição de Vila,  separa-se de Cachoeira do Sul (1857). Criado em 16.12.1857 o município é instalado em 17.5.1858.

Por Henrique Packter 03/11/2020 - 09:25

Na madrugada de domingo, 27 de janeiro de 2013, o mundo foi abalado por uma das mais espantosas tragédias ocorridas em casa de diversão ao longo da história. No incêndio da boate Kiss em Santa Maria, RS, rua dos Andradas 1925, morreram 242 pessoas e 680 outras ficaram feridas.

Há relatos e fotos chocantes da tragédia que roubou vidas jovens, a maior parte delas na casa dos 20 anos. Os corpos das vítimas, pisoteados, calcinados e irreconhecíveis, amontoavam-se por toda a parte. À destruição somou-se horror e sofrimento.

A notícia propagou-se e alcançou o mundo todo num instante.

Hoje, identificados e enterrados os mortos cuida-se ainda dos sobreviventes e de seus familiares aniquilados e traumatizados para todo o sempre. A sociedade busca ainda hoje respostas para perguntas que atormentam a cidade: Algum engenheiro assinou o projeto fatídico da boate? Quem, na Prefeitura e nos Bombeiros, autorizou o funcionamento da casa noturna? Qual a justificativa para o disparo efetuado por músico(s) de artefato incendiário em ambiente confinado e apinhado de pessoas? Porque extintores não foram utilizados e quando o foram não funcionaram? Como entender que o teto de uma boate-armadilha seja revestido por material inflamável?  Quem autorizou essa alteração? Qual a lotação da casa e quantas pessoas lá se encontravam quando da tragédia? Quantos funcionários da casa sobreviveram? Quem eram na realidade os proprietários da casa? Seria verdade que menores tiveram acesso à casa e consumiram bebidas alcoólicas?

Uma tragédia anunciada, resultado de prevenção negligenciada pelos órgãos públicos, funcionários e autoridades responsáveis. Pela segunda vez na história os olhos do mundo voltavam-se para Santa Maria. A primeira vez ocorrera 61 anos antes em 1952 e por razão exatamente oposta, um acontecimento hilário, inédito. É desse acontecimento que me ocuparei, porque de tragédias a humanidade está saturada.

Santa Maria, RS

Na foto o centro da urbe, a famosa primeira quadra da rua Dr. Bozano, fechada ao trânsito de veículos nas noites de sábado para footing de jovens estudantes, quando o tempo permitia.

Santa Maria já foi reconhecida como cidade ferroviária ou cidade coração do Rio Grande por estar situada em local estratégico, entrecruzamento de ferrovias, transbordo obrigatório para que pessoas da fronteira, do norte do estado gaúcho alcançassem POA. Aos nossos vizinhos Uruguai e Argentina também se ia pelo trem na minha época de estudante, anos 40 e 50. Rodovias inexistiam ou eram precárias. Santa Maria se tornou o maior entroncamento ferroviário do estado e talvez do país, ponto de encontro de comerciantes. A Avenida Rio Branco, que tinha no seu início a Gare da Estação, era nesse particular a via mais importante da cidade.

Livros registram a saga dos ferroviários gaúchos. Em 2007, lançamento de Fragmentos da História Ferroviária Brasileira e Riograndense, de João Rodolpho Flores. Numa das  Feiras do Livro santa-mariense foi lançado  Trabalhadores da V.F.R.G.S. – profissão, mutualismo, cooperativismo,  iniciativa editorial  da Câmara de Vereadores da cidade (Lei do Livro). Experiências de trabalho e de cidadania dos trabalhadores ferroviários do estado entre  1898 e 1957.

Com o declínio do transporte ferroviário e a ocupação ocorrida pelos investimentos em educação, a cidade passa a ser reconhecida como cidade universitária.  O professor e mais tarde reitor da Universidade de Santa Maria, José Mariano da Rocha Fº tem tudo a ver com isso. Em 1992, Marianinho, como era conhecido, recebeu o título de cidadão santa-mariense do século. Em 1999, com votação consagradora, foi eleito Gaúcho do Século, sendo o mais votado na Promoção da RBS TV/Zero Hora que escolheu 20 gaúchos que marcaram o século 20.

Santa Maria tem hoje 32 mil estudantes universitários em 7 Universidades. São 167 cursos de graduação, 51 de mestrado, 32 de doutorado, 4.106 professores  e 510.209 livros nas bibliotecas.  

Por Henrique Packter 28/10/2020 - 10:31 Atualizado em 28/10/2020 - 10:31

Rogério Martorano

As três maiores matérias que  produziu foram pauta do Jornalista Davi Nasser que indicou as séries: O natal de minha infância, Quando eles eram crianças, com 12 grandes personalidades do país e Solteirões famosos. 

Estabeleceu laços de amizade com o presidente JK e Carlos Lacerda, governador do RJ. Deste foi assador oficial em seu sítio de Petrópolis, o sítio do Alecrim, Rocio,  onde preparava pratos típicos da região sul como o carreteiro e entrevero. A casa de campo de Lacerda vizinhava àquela onde moravam Lota de Macedo Soares e a poeta americana Elizabeth Bishop. Lacerda frequentava o círculo de amizades das duas, que eram lacerdistas, embora não se encaixassem no pesado eufemismo que o cronista Antônio Maria usou, as mal-amadas, para satirizar as mulheres de classe média, em geral casadas e católicas, que se voluntariavam às pencas para fazer campanha por Lacerda no RJ.

Antes de se tornar o símbolo máximo da direita ideológica no panorama político da segunda metade do século passado, Carlos Lacerda foi um promissor militante de esquerda no RJ. Não apenas simpatizante do comunismo, como tantos jovens na década de 30 e nas seguintes, mas um ativista precoce que se destacou nas manifestações de rua e logo estaria no centro dos acontecimentos.

Durante o período da ditadura militar, Rogério tinha passe livre das forças armadas, auxiliando muitos jornalistas presos na época. Recebeu diploma de honra militar e medalha Marechal Hermes, maior condecoração do exército. Foi agraciado com o título de cidadão carioca pela Assembleia Legislativa do RJ.

Em 1972 publicou matéria especial sobre Lages,  a capital do papel, reportagem de mais de 30 páginas. Lançada no RJ com a presença do então Prefeito lageano Vidal Ramos.

Escreveu durante dez anos na Gazeta do Povo do Paraná toda quarta-feira, coluna sobre política e economia de SC. Disponibilizou material para Folha de São Paulo, Estadão, Jornal do Brasil e Jornal O Globo.

Residiu em Joinville-SC onde conheceu mulher que renderia histórica reportagem, mas ela se recusava a conceder entrevistas. Tornaram-se amigos e logo ela conta sua história. Chamava-se Fryderica Michailiszm e foi namorada de Adolf Hitler, aos 16 anos de idade. Era sua última matéria no Cruzeiro, último exemplar a circular em 1978. A edição teve repercussão internacional e ainda é exposta em museus pelo mundo.

Turismo

Numa de suas viagens com Chateaubriand voaram sobre a Serra do Rio do Rastro e Coxilha Rica, com destino a POA. Rogério apontou as belas paisagens da Serra Catarinense e seu potencial turístico. Em 1992 procurou os governadores do  RS e de SC e os prefeitos da região. Idealizou a rodovia Caminhos da Neve que integraria dois polos de turismo, Serra Catarinense e Gaúcha. Ideia de repercussão fantástica, a estrada ainda não foi concluída.

O abominável homem das neves

SALIM MIGUEL, de  quem tive o privilégio da amizade, contava-me que a cada inverno Rogério Martorano retornava de São Joaquim para o RJ  sobraçando fotos e cartazes alusivos às nevascas na serra catarinense. Tantas foram as fotos e reportagens que acabou conhecido como o ABOMINÁVEL HOMEM DAS NEVES

A SEGUIR: A GUERRA DO PENTE e O PRIMEIRO HOMEM A LAÇAR UM AVIÃO EM PLENO VOO.

Por Henrique Packter 23/10/2020 - 09:05

É aqui e agora que se revela o porquê de intitular-se essa série de artigos de O ABOMINÁVEL HOMEM DAS NEVES.  

ROGÉRIO MARTORANO

A saga de ASSIS CHATEAUBRIAND na revolução de 30, quando escapa de ser fuzilado em São Joaquim/ SC,  está detalhada no livro de Fernando Morais, CHATÔ, O REI DO BRASIL, que acabei por sintetizar. Salim Miguel, o grande e talvez maior escritor catarinense de todos os tempos, tinha um final barriga-verde para essa história, final esse que passo a relatar e que envolve o jornalista ROGÉRIO MARTORANO, filho de César Martorano, o homem a quem CHATÔ ficou a dever a vida.
Rigério é joaquinense, mas reside em Florianópolis. Jornalista aposentado, muito contribuiu para tornar conhecida sua cidade natal. Trabalhou por 20 anos na Revista O Cruzeiro de Assis Chateaubriand.

Contando Rogério sete anos de idade, seu pai, César Martorano, era proprietário de uma emissora de rádio na pequena São Joaquim, o que despertou em Rogério insuspeitada veia jornalística. 

OS INÍCIOS

Aos 18 anos Rogério já perseguia o sonho de ser jornalista. Ouvia seu pai falar de Chatô e decide ir ao RJ fazer o alistamento militar  e procurar o célebre proprietário da revista O Cruzeiro. Em janeiro de 1959 chega à cidade maravilhosa e vai à casa de Chatô. 1959 é o ano em que o autor dessas mal-traçadas e seu primo, Egídio Martorano, futuro prefeito de São Joaquim, deputado estadual por SC, secretário de Estado e o autor destas mal-traçadas, nos formamos na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Paraná.

CHATÔ CONHECE O FILHO DE SEU SALVADOR

Ao identificar-se como catarinense de São Joaquim, filho de César Martorano, Chateaubriand, levantou-se da cadeira e beijou-lhe a testa. Contou que seu pai salvara-lhe a vida; o que fazia no RJ? – Queria ser jornalista declara Rogério. Chatô promete fazer dele um jornalista e hospeda-o em sua casa por cerca de um ano e meio.

NA REVISTA O CRUZEIRO

Conheceu grandes nomes do jornalismo da época num almoço: Armando Nogueira, Davi Nasser, Luiz Carlos Barreto, Raquel de Queiroz, fotógrafo Jean Manzon... Na redação da revista O Cruzeiro inicia-se no jornalismo. Até chegar a repórter era saudado como foquinha, foca.

Divulgou de maneira maiúscula São Joaquim, elaborando reportagem sobre a neve, seu cenário suíço no Sul do Brasil. A partir daí todos os anos a revista estampava  em suas páginas matérias sobre a neve.

Por Henrique Packter 20/10/2020 - 11:12 Atualizado em 20/10/2020 - 11:15

Em POA,  Chatô contraria Osvaldo Aranha e se alista no exercito revolucionário como soldado raso. Ganha o competente uniforme, cantil, mochila, facão, uma inútil carabina Geco fabricada na Alemanha em 1922, pistola Lugger, pente de balas para ambas as armas de fogo, botas quase parceiradas. Assina sem ler os papeis que lhe apresentam  e parte de avião para Curitiba. Antes, visita o general Cândido Rondon mantido em prisão domiciliar na capital gaúcha por recusar-se a aderir ao movimento revolucionário.

O aguaceiro continua. Percorre de taxi o trajeto Curitiba-Ponta Grossa onde se encontra com Vargas e faz a primeira entrevista concedida pelo chefe supremo da revolução, matéria publicada no Diário de Notícias de POA, órgão Associado.

Volta a Curitiba onde permanece por mais de uma semana e onde entrevista todo mundo para artigos que seriam publicados após 4 de novembro. Em Ponta Grossa, monta sua cama no vagão-dormitório do trem, ao lado da cama do general Gois Monteiro e  até 24 de outubro não sai mais de perto do chefe militar da revolução.

Enquanto isso, Washington Luís rejeita proposta de demissão trazida pelo cardeal Sebastião Leme e é deposto pelo general Augusto Tasso Fragoso que assume a chefia de governo provisório. Chatô era testemunha ocular da história, futuro slogan do Repórter Esso (1941). Às sete da manhã conversa com Vargas sobre a política externa que pretendia implantar. Ficou evidente para ele que Vargas não nutria lá muita admiração pelos yankes e chega a dizer que estranhava esta veia americanófila do jornalista. Chatô consubstancia seu pensamento em política internacional declarando:

- Sem os EUA nós não passamos de um espirro de gato.

Presidente deposto e preso esmorece o ânimo paulista e a ansiada Batalha do Itararé acaba não ocorrendo. O trem estacionado há dias em Ponta Grossa  põe-se em marcha agora repleto de notáveis. Cai a censura à imprensa  e a partir de 27 de outubro os jornais de Chateaubriand passam a publicar reportagens e artigos sobre a revolução. O RJ é invadido pacificamente por milhares de jovens soldados,lenços vermelhos no pescoço. Menos de 2 semanas após a posse de Vargas, Chatô publicava artigo acusando o governo revolucionário de Ditadura.

Naquela primeira entrevista concedida por Vargas a Chatô ele explicitava os 17 pontos de seu governo. Chato chamava o Hotel Glória de  O Covil dos Gaúchos, pois lá viviam vários deles. As relações entre Chatô e Vargas são ora cordiais, ora pouco amistosas. Com o interventor de SP, seu desafeto, entabulou polêmica repleta de escândalos, acusado que foi de receber dinheiro público para publicar notícias favoráveis ao governo. Chatô admitiu o fato aduzindo que não era o único jornalista  a fazê-lo.

No final de 1930 escreve artigo em que menciona pela primeira vez o nome oficial e registrado do poderoso grupo, os  Diários Associadosonde, onde  Chatô escrevia seus artigos, sempre a lápis.

Getúlio Dornelles Vargas

Presidiu o Brasil em dois períodos. O primeiro, de 15 anos ininterruptos,1930 a 1945.  Costuma-se dividi-lo em 3 fases: 1930 a 1934, como chefe do Governo Provisório; de 1934 a 1937 como presidente da república do Governo Constitucional, eleito pela Assembleia Nacional Constituinte de 1934; e, de 1937 a 1945, como ditador, durante o Estado Novo implantado após golpe de Estado.

No segundo período, eleito por voto direto, Getúlio governou o Brasil por 3 anos e meio: de 31.1.1951  a 24.8.1954, quando comete suicídio, no Palácio do Catete, RJ, então capital federal.. Getúlio era chamado por seus simpatizantes de pai dos pobres, devido à legislação trabalhista e políticas sociais adotadas sob seus governos. Adotou doutrina e estilo político denominados de getulismo ou varguismo. Seus seguidores, até hoje existentes, são getulistas. Era tratado pelas pessoas próximas de Doutor Getúlio, e as pessoas do povo se referiam a ele como Getúlio.

Influente até hoje sua herança política é invocada e disputada por. pelo menos, dois partidos políticos: o Partido Democrático Trabalhista (PDT) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Getúlio Vargas foi inscrito no Livro dos Heróis da Pátria, em 15.9.2010. 

Por Henrique Packter 15/10/2020 - 17:35

O próprio juiz de direito, José Fonseca Nunes de Oliveira e o prefeito Boanerges Pereira de Medeiros disputavam o privilégio de hospedá-lo. Mas, dormiu mesmo na pensão até a madrugada seguinte.  Meio mundo de curiosos acompanharam e velaram seu repouso do lado de fora da pensão.. Manhãzinha cedo acorda para seguir viagem a Bom Jesus, no RS.

A viagem para o RS

Acompanhado de César Martorano e de Antonio  Palma parte a cavalo para alcançar Vacaria e, finalmente, POA. Até Vacaria eram 100km, um terço do trecho percorrido de  Florianólpolis a São Joaquim. Foram mais 3 dias para vencer a escarpada costa do Lava Tudo. Boca da noite jantam na fazenda do coronel Inácio Palma, pai dos 3 jovens irmãos Palma. Andam mais, até alcançar a fazenda de Augusto Pires às margens do Lava Tudo que separa Lages de São Joaquim. Saem dia escuro com Nico Pires, filho do fazendeiro  e bom conhecedor da região. Ele guia o grupo até local bem estreito do rio, embora  muito encachoeirado e caudaloso. Ali vadeiam o curso dágua.  Nico atravessa a nado, um a um, cavalos e cavaleiros. Tudo na  mais absoluta escuridão e silêncio, debaixo de chuva torrencial. Terminada a proeza Chatô tira bolo de notas dos bolsos, dá uma parte delas ao rapaz, sem contar.

A Coxilha Rica

A cavalgada pela montanha se estende pelo dia inteiro. Dormem a noite do dia 8 na Coxilha Rica do coronel Belisário Ramos, pai de Aristiliano Ramos, edil em Lages e incorporado ao exercito revolucionário em POA. Coxilha Rica, em Lages  tem 100 km² de zona rural num planalto a mais de 1.000 m acima do nível do mar. Predomina a vegetação rasteira de gramíneas; onde ocorrem remanescentes de floresta encontra-se a araucária. Coxilha, como todo mundo sabe, é vasto terreno ondulado. O solo da Coxilha Rica é pouco profundo, pedregoso, não muito fértil e coberto de gramíneas que no inverno ressecam com a geada e com o vento..  

Primeira via terrestre de ligação entre sul e sudeste do Brasil, o Caminho das Tropas, traçada no século 18 , abrangia a Coxilha Rica. Passavam pela região tropeiros levando gado do RS a SP (Sorocaba) e sul de MG. Nesta região correm os rios Pelotas, Pelotinhas, Penteado, Lageado Bonito e o Lava-Tudo.

As propriedades privadas instaladas na Coxilha Rica são fazendas destinadas à pecuária, à criação de gado utilizando  pastagem natural. Há séculos cria-se gado na região, que concentra a maior variedade de raças bovinas de corte do Brasil. Raimundo Colombo ex-governador de SC e lageano de muitos costados é grande proprietário rural na Coxilha Rica.

Em solo gaúcho

Beirando o rio Pelotas, caminho de Bom Jesus,  raiando o dia haviam atravessado o rio Pelotas e estavam em solo gaúcho.  Chegam a Bom Jesus à noite. Despede-se dos acompanhante e só então vasculha os próprios bolsos. No fundo de um deles encontra a amarfanhada passagem do hidroavião, preenchida com todos os seus dados do embarque a 3 de outubro, no RJ. Talvez se exibida fosse em São Joaquim teria lhe poupado grande sofrimento.  Poucas horas e estava em Vacaria onde encontra o general Valdomiro Lima sitiando a cidade com  incrível exército brancaleone de voluntários. Um carro do exército deixa-o em POA, na metade da tarde do dia 10 de outubro,  uma semana após o embarque  no avião da Condor no RJ. POA era uma praça de guerra onde encontrou apenas Osvaldo Aranha, agora governador do RS.  Vargas e seu estado-maior viajavam pela ferrovia rumo ao PR . Poucas horas antes, outra composição partira levando 3 mil soldados da cavalaria. 

Por Henrique Packter 13/10/2020 - 07:57 Atualizado em 13/10/2020 - 07:58

O Estado Menor joaquinense que aprisionara Chatô se pergunta:

- Aquele nanico queria se fazer passar pelo jornalista Assis Chateaubriand, dono de jornais e rádios, aliancista de primeira hora? Declarado espião, o julgamento e condenação  à morte acontecem ali mesmo! O pelotão de fuzilamento constituído de sete revolucionários, também foi sorteado na hora. Era um espião do governo, isso sim! Major Bibiano ainda acusou de covardia e dignos de também serem fuzilados as poucas vozes que pediam por cautela, por acalmar os ânimos, por aguardar um pouco antes de tomar tão drástica decisão. Chateaubriand inutilmente advogou em causa própria. Pediu que mandassem emissário a Bom Retiro, ouvir Gerôncio Thibes, ou ir a Florianópolis atrás de Rupp Júnior. Debalde. Ia morrer pelas armas da revolução que ajudara a desencadear.  

A reviravolta

E afinal, quem era Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello?

Chateaubriand ou Chatô, criou e dirigiu a maior cadeia de imprensa na históri do país, os Diários Associados: 34 jornais, 36 emissoras de rádio, 18 canais de televisão, uma agência de notícias, uma revista semanal (O Cruzeiro), uma mensal (A Cigarra), várias revistas infantis (a primeira O Guri, 1940, em quadrinhos), e a editora O Cruzeiro. Foi senador da república por  duas vezes, membro da Academia Brasileira de Letras, fundador do MASP, museu de assombroso acervo, criou a campanha Deem Asas Ao Brasil que doava aviões de treinamento para aeroclubes brasileiros, embaixador do Brasil na Inglaterra, autor de mais de 18 mil artigos de jornais. Cognominado de Bucaneiro Político pelo emprego nem sempre ético de seus veículos de comunicação.Este homem estava para ser fuzilado na obscura cidade de São Joaquim em SC, acusado de espionagem em   favor do governo Washington Luís, governo que combatia.

O fuzilamento

Chatô, verdade verdadeira, estava exausto e encostara-se no muro do fuzilamento. Viu, vagamente, alguém cochichar coisas nos ouvidos de Bibiano. Era alguém  da comunidade que vinha advertir Bibiano de que o  garoto César Martorano, agora agraciado com a patente de tenente revolucionário, representava O Jornal do RJ em São Joaquim. Este jornal era carro chefe do  jornalismo de Chateaubriand. Martorano angariava assinaturas para o jornal e eventualmente mandava notícias da cidade mais fria do  Brasil. Tinha carteira funcional para identificá-lo como membro da família dos Associados e a carteira estava assinada pelo verdadeiro Assis Chateaubriand. Findos os  cochichos Bibiano decide adiar a execução por uma hora e confina o infeliz prisioneiro a prisão na pensão do Apolinário. Dois praças armados levam Chatô algemado até o albergue. Apolinário decreta  que ninguém se hospeda na pensão sem registrar-se no competente livro de hóspedes. Entrega o grande livro negro a Chatô, mais caneta, tinteiro e mata-borrão. Com o indicador direito, unha quase limpa, aponta a linha a ser preenchida, como era de lei. Nome por extenso,  profissão, estado civil e assinatura. Assinado o tal livro, Bibiano carrega pressurosamente com o mesmo até a farmácia de Blayer onde César Martorano já o aguardava, carteirinha na mão. Tinha ela duas assinaturas: uma do gerente Orlando Ribeiro Dantas, já a de Chateaubriand era ilegível e infalsificável, montoeira de garranchos incompreensíveis. Bibiano detém-se  no exame e conferência das assinaturas, ao cabo do qual exame volta-se para a pequena multidão de pessoas aglomeradas na porta da botica, penitenciando-se: quase fuzilamos um inocente, o homem preso na pensão é mesmo o Dr.Assis Chateaubriand!

Por Henrique Packter 08/10/2020 - 17:26 Atualizado em 08/10/2020 - 17:27

Em Urupema

CHATÔ como já se disse, era bom de cama. Deitou e imediatamente ferrou no sono, roncando adoidado até 5 e meia da manhã numa cama improvisada. Acordado com fortes safanões, conhece o guia André, providenciado por Thibes, um polaco louro, mas rústico  como um bugre escreveria Chatô  Seria sua companhia até Urupema. Chatô não pode  deixar de rir-se da própria indumentária, vestida até com certa elegância. Entre os acessórios  estavam chapéu de aba larga, presente do engenheiro Baldassini, construtor de seu jornal no RJ, uma capa azul da Casa Burberry, Londres, ambos nunca antes usados. Montam e somem na escuridão.

Inicia a longa cavalgada

Chove o tempo todo. Homens e animais sobem a serra por 9 horas  seguidas. Cerca das 2 da tarde Chatô estava descadeirado  e tinha nádegas e pernas assadas pelo atrito com os arreios.

Chegam à fazenda de Maneco Arruda,  uma vez que Jango  Mattos, indicado por Rupp, falecera em acidente com arma de caça. Almoçados fartamente com carne  de caça, o dia ainda não escurecera quando guia e jornalista caem sobre camas às pressas arranjadas. Despertados às 4 da manhã fazem rápida refeição.   Chuva inclemente continuava sem dar tréguas e Chatô usava emplastros providenciados pela mulher de Arruda para aliviar as virilhas em carne viva  pela cavalgada. Antes do dia clarear  estão em Painel. Dali em diante seria guiado por Dinarte Couto Arruda, fazendeiro e presidente do Partido Republicano na região.

Chatô fica sabendo que o novo guia seria sua companhia até Monte Alegre. Dali a São Joaquim, era uma reta de 2 léguas que percorreria sozinho. Coisa de uma hora a cavalo.

Chateaubriand em São Joaquim

O chefe local da Aliança em São Joaquim era João Palma, a  cidade totalmente favorável ao golpe de 30, getulista, portanto. Chico Palma, terceiro dos irmãos Palma, tinha um arsenal em mãos, mais de 80 armas de fogo. Já no dia 4, sabedores que a revolução começara em POA,  cercaram o alojamento de madeira de 10 soldados comandados por um tenente. Eles se renderam a 100 civis armados,  sem esboçar reação.  O autoproclamado major Bibiano Rodrigues Lima comandava um destacamento, distribuindo patentes militares de capitão e tenente revolucionário a seus homens de confiança. Quando Chatô chega à cidade, ela estava sob total domínio das forças  getulistas. Situada a uma altitude de 1.354 metros tem população estimada em 2019 de 26.952 habitantes. Situada no Planalto Serrano, dista 85 km de Lages e 232 km de Florianópolis. A cidade conta com uma grande diversidade étnica, composta principalmente por descendentes de portugueses, alemães, italianos, japoneses e indígenas. Grande parte da população migrou de outros estados, principalmente do RS.

Chatô chega a São Joaquim sem as cartas de recomendação escritas por Rupp Júnior, sem documentos, sem dinheiro. Chega debaixo de chuva que teimava em continuar já fazia três dias. O tempo era frio quase insuportável e a capa azul não protegia do tempo inclemente. Ademais, obrigava-se a caminhar com as pernas bem arqueadas: as assaduras provocavam sensação muito dolorosa ao andar. Já fazia três dias de uma viagem programada para poucas horas. Bate à porta do farmacêutico Hilário Blayer, a quem conta suas desditas. Para quem ouvia, a coisa toda era inverossímil. Deixa Chatô diante do balcão da botica e parte em busca dos três irmãos Palma, que logo chegam. O Major Bibiano também vem a reboque mais capitães e tenentes. Todos armados até os dentes e má catadura, o que assustou Chatô, obrigado a repetir sua história.  Bibiano  era um paisano sanguinário, ansioso por vingar o pai, morto em Lages, num dos tantos entreveros políticos da região.  Chatô viu sua história ser ouvida com incredulidade e desdém.

Por Henrique Packter 05/10/2020 - 12:05

Já vimos que o jornalista Assis Chateaubriand embarcou a 3.10.1930 no RJ, noventa anos atrás,  em hidroavião da empresa Condor, pilotado por dois aviadores alemães, com destino a POA para se juntar às tropas revolucionárias comandadas por Getúlio Vargas e Góis Monteiro. Marchava o RS rumo ao RJ para derrubar o governo do presidente Washington Luís. A viagem de Chatô teria duração de poucas horas com escala prevista em Florianópolis. O terrível mau tempo, as chuvas incessantes e a revolução em marcha interrompem o voo na capital catarinense, onde Chatô soube que sua prisão fora decretada pelo governado Fúlvio Aducci, leal ao governo federal. Chatô procura Nereu Ramos (que estava em POA) e depois Henrique Rupp Jr.

Rupp  oferece refúgio em sítio seu, próximo a Florianópolis, coisa que CHATÔ recusa. Só aceita solução que o leve a POA. Então, de Florianópolis viajaria de carro a Bom Retiro (3 horas e meia), Dali a cavalo pelos altos da Serra do Mar a Urubici (37 km) e, sempre a cavalo, até São Joaquim (61 km). Onze horas de noite escura, CHATÔ mais motorista são embarcados por Rupp rumo a Bom Retiro. CHATÔ vestia batina negra.

Dois carros participam da fuga. Num dos carros vão motorista desarmado e CHATÔ. No carro de trás 3 homens armados davam proteção. Faltando 15 minutos para a meia-noite Rupp entrega 3 cartas a CHATÔ. Uma delas para Gerôncio Thibes  em Bom Retiro que forneceria meios para que alcançasse São Joaquim. A segunda e terceira  para João e Antônio Palma e ao farmacêutico Hilário Blayer,  todos conspiradores da Aliança Liberal,  liderada por Vargas.

Batina  sobre o terno, nas mãos  capa e chapéu, começa a viagem debaixo de chuva que  enlameava a estrada. O motorista para  o carro e coloca correntes nas rodas. O mesmo fez o carro de segurança 5 km atrás. Perto das 3 horas da manhã próximos a Bom Retiro dois troncos atravessados na estrada impedem a passagem do     carro. Era tosco posto policial, guardado por dois soldados armados de fuzil. Eles indagam se poderiam dar notícia do jornalista Assis Chateaubriand  cuja prisão fora decretada pelo governador. Teriam cruzado com algum veículo suspeito? CHATÔ pediu para ler o telegrama assinado por Marinho Lobo , chefe de polícia. Documento lido, CHATÔ denuncia o carro de segurança como possível viatura que estaria dando fuga ao jornalista. Passam a correr pela estrada estreita e sinuosa, parando adiante para derrubar o poste de telégrafo que foi atravessado na estrada com o fio   cortado. Chegam em Bom Retiro então vilazinha de meia dúzia de casas, igreja protestante, hospedaria, botequim e farmácia.. Acordam morador que os atende, lamparina numa das mãos, fuzil na outra. Dá o endereço de Gerôncio Thibes, morador numa chácara.

Hóspede de Thibes em Bom Retiro

Apresentada e lida a carta de Rupp Júnior, Chatô queima as cartas de apresentação de Rupp para São Joaquim,  mais a batina. 

Thibes explica que a trilha entre Urubici e São Joaquim fora destruída pelas chuvas incessantes. Precisava usar caminho alternativo, duas vezes mais longo, para São Joaquim. Melhor, aconselhou, era sair de Bom Retiro a cavalo até Canoa e Urupema. A cavalo porque a essa altura o carro utilizado já fora identificado pelos legalistas. Dormiria em Urupema seguindo até Painel onde atravessaria o rio e a serra do Lava-Tudo, só então chegando a São Joaquim

Por Henrique Packter 29/09/2020 - 19:35

O jornalista FRANCISCO DE ASSIS CHATEAUBRIAND BANDEIRA DE MELLO (Chatô) dono do poderoso DIÁRIOS ASSOCIADOS, chega ao aeroporto do cais Pharoux, RJ, para apanhar o hidroavião que o levaria a juntar-se às forças revolucionárias gaúchas. Inicia viagem RJ-POA às 5,30 horas de chuvosa sexta-feira, 3.10.1930, embarcando no Junkers G-24 da CONDOR. Soubesse ele dos dissabores que o esperavam nos 7 dias seguintes, esqueceria a viagem.
Era proibido fumar em qualquer momento do voo ou portar arma de fogo nos hidroaviões. CHATÔ entregou revólver e charutos.
Más condições meteorológicas obrigam o piloto Heinz Puetz voar a 50 m de altura com 9 passageiros, enfrentando tempo terrível no avião lotado.  Vencem os 300 km até Santos em 4 angustiantes horas.

Reabastecido, o avião decola e  avança menos de 150 km. Tempo ruim, teto precário faz Puetz pousar na estreita faixa entre Ilha Comprida e continente. Voa os 50 km seguintes com os flutuadores esquiando sobre as águas do canal. Pelo meio-dia piora o tempo que já era ruim, Puetz desliga os motores e o avião flutua diante de Cananéia e seus dois canhões coloniais. Às 3 da tarde, quando deveria sobrevoar POA, Puetz decola, avisando que avançariam 70 km até Paranaguá, onde pernoitariam.

Chegam às 17 horas  e partem às 6,30 da manhã seguinte com sol e tudo, mas ainda sem notícias do movimento revolucionário. Puetz calcula em duas horas a viagem a POA com rápida escala em Florianópolis. Aqui, telegrama em alemão aguarda o piloto: a situação está muito difícil em POA, única frase que CHATÔ consegue ler. Cancelado restante do voo, a viagem terminava em Florianópolis. O pior estava por vir. Em São Joaquim, a 120 km, a cidade preparava-se para acontecimentos verdadeiramente inacreditáveis na história da revolução e do país. 

O império de Chatô

Começa a montar seu império jornalístico a partir do final dos anos 20. Reúne sob seu comando mais de 100 jornais, revistas, estações de rádio e TV. Nos anos 40 e 50, é um dos homens mais influentes do país, temido pelas campanhas jornalísticas que encabeça como aquela contrária à criação da Petrobrás. Pioneiro na transmissão do sinal de televisão no país, cria a TV Tupi em 1950. No Estado Novo, consegue de Getúlio Vargas a promulgação de decreto que lhe dá direito à guarda da filha, após separar-se da mulher. Na ocasião, cunhou a frase: Se a lei é contra mim, vamos mudar a lei. Criou o Museu de Arte de São Paulo (Masp) (1947) com Pietro Maria Bardi. Senador pela Paraíba (1952) e pelo Maranhão (1955), redigia seus artigos a lápis, exceto após trombose  que o deixou tetraplégico(1960).  Trabalha até o final da vida e morre em São Paulo (1968). 

Por Henrique Packter 23/09/2020 - 07:35

A trajetória dos Diários Associados começa em 1924 quando o jornalista Assis Chateaubriand contava 32 anos e adquire O Jornal, diário que circulava no RJ  desde 1919. Depois, com a aquisição de outras empresas de mídia impressa, rádio e TV o grupo se torna o mais importante do Brasil. Em 1925, compra o jornal paulista Diário da Noite. Em 1928, funda a empresa gráfica O Cruzeiro e, em 1934, adquire revista mensal A Cigarra. Em MG compra o jornal Estado de Minas (1929). Ainda em 1929 funda o Diário de São Paulo. Diário da Tarde nasce em 1931. Chatô criou ainda, no RJ, a Agência Meridional e a Rádio Tupi. A elas se juntariam a Rádio Tupi de SP  e a Rádio Educadora, rebatizada Rádio Tamoio, RJ.  A televisão vem em 1950 com a TV Tupi de SP, primeiro canal de TV da América Latina. Neste ano da graça de 2020 a TV brasileira comemora 70 anos de atividades.

Ícone da imprensa

Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Mello o Chatô (4.10.1892-4.4.1968), foi jornalista, empresário, mecenas, político, advogado, professor de direito, escritor, empresário, diplomata e membro da Academia Brasileira de Letras.  Um dos homens públicos mais influentes do Brasil nas décadas de 40, 50 e 60, magnata das comunicações no Brasil, justamente esse homem estava prestes a ser fuzilado em São Joaquim, SC, em outubro de 1930. 

Dono dos Diários Associados, o maior conglomerado de mídia da América Latina, no seu auge contou com mais de cem jornais, emissoras de rádio e TV, revistas e agência telegráfica. Chegou a editar 34 jornais no país, além de possuir 36 estações de rádio, 18 de televisão, uma agência de notícias, várias revistas infantis e a Editora O Cruzeiro, com a revista semanal do mesmo nome, periódico de maior circulação na América Latina. Senador pela Paraíba e pelo Maranhão, renunciou a este último mandato quando designado embaixador em Londres por JK (1957-1960). Escreveu livros e tornou-se imortal da Academia Brasileira de Letras, onde ocupou a cadeira nº 37.

Odiado e temido, polêmico e controverso, Chateaubriand, o Cidadão Kane brasileiro, foi acusado de inescrupuloso, antiético, por supostamente chantagear empresas não anunciantes em seus veículos. Também por insultar empresários com inverdades, como aquelas assacadas contra o industrial Francisco Matarazzo Jr. Seu império parecia construído com base em interesses e compromissos políticos, incluindo proximidade turbulenta, mas proveitosa, com o Presidente Vargas.

Criador e fundador do Museu de Arte de SP com Pietro Maria Bardi (1947), em 4.10.1968, data da morte de Chateaubriand e trinta e oito anos após o episódio sobre o qual escrevo, Pietro Maria Bardi, pendurou três obras-primas na câmara ardente onde Chatô era velado: Banhista com o Cão Grifo, nu gigantesco de Renoir, o Retrato do Cardeal Cristófaro Madruzzo, de Ticiano, e Don Juan António Llorente, de Goya, majestoso retrato do secretário da Inquisição espanhola. Direção dos Associados considerou ofensiva tal exposição no velório (duas telas religiosas e um nu artístico). Exige a retirada das obras, mas Bardi bate o pé:

- Mas dottore, é minha última homenagem a Chatô. Nesta parede, estão as três coisas que ele mais amou na vida: o poder, a arte e mulher pelada. É a última frase do livro Chatô, o rei do Brasil, 695 páginas – que Fernando Moraes lembrou, ao ver o filme homônimo de Guilherme Fontes que retrata com humor e sarcasmo homem patologicamente obcecado pelo poder, mulheres.  e o sonho de construir museus para civilizar o Brasil. 

CHATÔ foi escrito baseado em entrevistas sobre Assis Chateaubriand.

Por Henrique Packter 16/09/2020 - 08:45

Dia 25 de setembro, data natalícia de Roquette-Pinto,  o Pai do Rádio Brasileiro, é o Dia do Rádio, o veículo de comunicação mais utilizado no Brasil.

O físico escocês James Maxwell (1860) descobriu as ondas de rádio. Não há consenso sobre quem inventor a radiodifusão. Pleiteiam essa condição o italiano Gulgielmo Marconi, que patenteou a transmissão-recepção eletrônica utilizando sinais telegráficos em código Morse  (1896), e o norte-americano Nikola Tesla.

Por que existe esta controvérsia?

Existe porque Marconi utilizou em sua invenção mais de 20 equipamentos patenteados por Tesla. Vai daí, em 1915 o norte-americano reivindica na Justiça dos EUA a patente da invenção do rádio. Em 1943, quase 30 anos depois, a Suprema Corte americana reconhece Tesla como o inventor do rádio!

O brasileiro Roberto Landell de Moura, padre gaúcho, teria realizado (1) transmissões de rádio em 1893 (dois anos antes de Marconi), e (2) a primeira transmissão de voz humana no Brasil, em 1899. Ele patenteou um sistema de transmissão no Brasil, em 1901. O rádio, tal como o conhecemos hoje, foi possível pela contribuição de todos esses participantes, cada um com seu experimento distinto.

A primeira transmissão de rádio ocorreu num evento esportivo na regata de Kingstown, para jornal de Dublin. As primeiras utilizações foram para manter contato com navios em alto-mar. Mas, na época, o rádio era incapaz de transmitir a fala; enviava mensagens em código Morse, ligando navios a estações em terra.

Durante a Primeira Guerra Mundial o rádio alcançou seu maior momento de utilização. Os litigantes usavam o rádio para transmitir mensagens militares na frente de batalha. Finalizada a guerra, com o crescimento dos receptores de rádio, a transmissão começa na Europa e EUA.

Oficialmente, a transmissão de voz ocorre em 1921 e foi introduzida às ondas curtas 98 anos atrás (1922).

A primeira transmissão oficial radiofônica no Brasil aconteceu em 1922, RJ, comemorativa ao centenário da nossa independência, sendo presidente Epitácio Pessoa No ano seguinte foi fundada por Roquette-Pinto a primeira emissora de rádio do país: a Rádio Sociedade do RJ.

Em 1938 o Brasil acompanhou as transmissões dos jogos da Copa do Mundo, da França, e se rendeu ao jornalismo radiofônico que noticiava os temores da Segunda Guerra Mundial. Na década de 1940 o noticiário radiofônico Repórter Esso (1941) é  o programa que melhor sintetiza a importância do  rádio na vida das pessoas.. Surgem as primeiras emissoras em frequência modulada (FM), com qualidade de som melhor que as AM. No início, FMs operavam apenas com música instrumental, ideal para salas de espera e interiores.

Chatô

Começa a montar seu império jornalístico a partir do final dos anos 20. Reúne sob seu comando mais de 100 jornais, revistas, estações de rádio e TV. Nos anos 40 e 50, é um dos homens mais influentes do país, temido pelas campanhas jornalísticas que encabeça como aquela contrária à criação da Petrobrás. Pioneiro na transmissão do sinal de televisão no país, cria a TV Tupi em 1950. No Estado Novo, consegue de Getúlio Vargas a promulgação de decreto que lhe dá direito à guarda da filha, após separar-se da mulher. Na ocasião, cunhou a frase: Se a lei é contra mim, vamos mudar a lei. Criou o Museu de Arte de São Paulo (Masp) (1947). Senador pela Paraíba (1952) e pelo Maranhão (1955), redigia seus artigos a lápis, exceção após trombose  que o deixou tetraplégico(1960).  Trabalha até o final da vida e morre em São Paulo (1968). 

Por Henrique Packter 12/09/2020 - 07:35

Rupp  oferece refúgio em sítio seu próximo a Florianópolis, coisa que CHATÔ recusa. Só aceita solução que o leve a POA. De Florianópolis viaja de carro a Bom Retiro (3 horas e meia), Dali a cavalo pelos altos da Serra do Mar até Urubici (37 km) e dali, sempre a cavalo, até São Joaquim (61 km). Onze horas de noite escura, Rupp vai de carro buscar CHATÔ, que vestia uma batina negra.

Dois carros participam da sofisticada fuga. Num dos carros vão motorista desarmado e CHATÔ. No carro de trás 3 homens armados davam proteção. Faltando 15 minutos para a meia-noite Rupp entrega 3cartas a CHATÔ. Uma delas para Gerôncio Thibes  de Bom Retiro que forneceria meios para que alcançasse São Joaquim. A segunda e terceira  para os joaquinenses  João e Antônio Palma e para o farmacêutico Hilário Blayer, também em São Joaquim), todos conspiradores da Aliança Liberal,  liderada por Vargas.

Batina  sobre o terno, nas mãos  capa e chapéu, começa a viagem debaixo de chuva enlameando a estrada. O motorista freia o carro para colocar correntes nas rodas. O mesmo fez o carro de segurança 5 km atrás. Perto das 3 horas da manhã próximos a Bom Retiro dois troncos atravessados na estrada impedem a passagem do carro.    

Era pequeno posto policial guardado por dois soldados armados de fuzil que indagaram aos dois ocupantes do carro se podiam dar notícia do jornalista Assis Chateaubriand  cuja prisão fora decretada pelo governador. Haviam cruzado com algum veículo suspeito? CHATÔ pediu para ler o telegrama assinado por Marinho Lobo , chefe de polícia. Terminada a leitura do documento CHATÔ denunciou o carro de segurança como possível carro que estaria dando fuga ao jornalista. Passaram a correr pela estrada estreita e sinuosa, parando mais adiante para derrubar o poste de telégrafo que foi atravessado na estrada com o fio   cortado. Em Bom Retiro então vilazinha de meia dúzia de casas, igreja protestante, hospedaria, botequim e farmácia.. Morador acordado, lamparina numa das mãos, fuzil na outra, dá o endereço de Gerôncio Thibes, morador numa chácara.

HÓSPEDE DE THIBES EM BOM RETIRO

Apresentada a carta de Rupp Júnior as coisas andam com facilidade. Neste local, CHATÔ  queimou as cartas de apresentação de Rupp para São Joaquim,  mais a batina. 

Thibes explica que a trilha entre Urubici e São Joaquim fora destruída pelas chuvas incessantes. Precisava usar caminho alternativo, duas vezes mais longo, para São Joaquim. Melhor, aconselhou, era sair de Bom Retiro a cavalo até Canoa e Urupema. A cavalo porque a essa altura o carro utilizado já fora identificado pelos legalistas. Dormiria em Urupema seguindo até Painel onde atravessaria o rio e a serra do Lava-Tudo e só então chegar a São Joaquim.

EM URUPEMA

CHATÔ como já disse, era bom de cama. Deitou e imediatamente conciliou o sono, roncando adoidado até 5 e meia da manhã numa cama improvisada. Acordado com fortes safanões conhece o guia André, providenciado por Thibes: “um polaco louro, mas rústico  como um bugre”.  Seria sua companhia até Urupema. Chatô não pode  deixar de rir-se da indumentária que vestia até com certa elegância. Entre os acessórios  estavam chapéu de aba larga, presente do engenheiro Baldassini construtor de seu jornal no RJ, uma capa azul da Casa Burberry, Londres, nunca antes usados. Montam e somem na escuridão.

Por Henrique Packter 08/09/2020 - 09:35

Dia 4 de outubro de 1930 é a data de início da revolução de 30 no Brasil, encerrada com a vitória dos revolucionários, gaúchos, mineiros e paraibanos. O movimento durou 20 dias, período no qual a imprensa esteve censurada. 

Notável característica de CHATÔ era a capacidade de dormir e dormir bem em qualquer situação. Foi o que aconteceu viajando para POA em hidroavião da Condor, viagem tumultuada pelo mau tempo. Ao cabo de um dia do embarque no RJ ainda está em hotel de Paranaguá, PR, onde  acorda com fortes golpes na porta, às 6  da manhã de dia ensolarado,  de atmosfera límpida e cristalina e de céu luminoso. A escala prevista em Florianópolis seria breve assegurava o comandante alemão Puetz, aquecendo os motores às 6,30 horas da manhã.

Em Florianópolis telegrama da sede da Condor no RJ, redigido em alemão, aguarda Puetz. CHATÔ era fluente em alemão. Por cima dos ombros  dos pilotos consegue ler: “a situação está muito difícil em POA”. Esta linguagem, posso garantir, não se referia à calamitosa situação do Grêmio no campeonato brasileiro. Significava, que a viagem terminava em Florianópolis. Sem hesitar CHATÔ reúne-se com os3 tripulantes na cabine de comando, mais Paes Leme e revela que às 5,30 horas da tarde do dia anterior revolução de caráter nacional explodira em POA, Belo Horizonte e Paraíba. Disse mais: estava envolvido com a conspiração e corria a POA para alistar-se como voluntário e lutar ao lado de Getúlio,  Leme, logo depois e reservadamente, estende uma pasta contendo vinte contos de réis a CHATÔ que dispunha de um conto e 500 réis. Com esta importância tentam corromper o comandante Puetz  para levar CHATÔ até Torres, RS, pouco mais de uma hora de voo. Lá, estaria a salvo. Do contrário, permanecendo em  SC (que apoiava o governo de Washington Luís), poderia ser aprisionado ou coisa pior a qualquer momento.

Quanto estavam oferecendo a Puetz pelo voo de uma hora até Torres? Um conto de réis em 1930 valia R$ 123.000,00 donde Puetz recusou debaixo de pesados impropérios cerca de R$ 2.700.000,00 ou 21 contos e quinhentos.

Em Florianópolis, ignorando o que ocorria, Chatô sentia-se um animal  acuado. Como chegar a POA? Pensou em procurar Nereu Ramos, jornalista, ex-deputado federal, de rica família de estancieiros lageanos. Nereu,  fazia 4 dias estava em POA. Lembrou do nome de homem de confiança de Nereu em Florianópolis e vai atrás de Henrique Rupp Jr, jornalista e ex-deputado, alemão troncudo de meia idade, cabelo escovinha. Rupp sabia do que estava ocorrendo em POA. Estradas e portos em SC estavam bloqueados por tropas do exército, informou. Governador catarinense Fúlvio  Aducci, perfilado no exército de Washington Luís,   contava com total simpatia e confiança do governo central legalista. A ponto da Presidência da República deslocar  a sede da 5ª  Região Militar no Paraná para SC, nomeando para comandá-la o general Nepumoceno Costa.

Por Henrique Packter 04/09/2020 - 07:10 Atualizado em 04/09/2020 - 07:11

(Baseado em CHATÔ O REI DO BRASIL de FERNANDO  MORAIS e em prosas no CAFÉ SÃO PAULO)

Às 5 e meia horas da manhã  chuvosa de  sexta –feira, 3 de outubro de 1930, dia escuro, cerração baixa e úmida,  FRANCISCO de ASSIS CHATEAUBRIAND BANDEIRA de MELLO (CHATÔ) chega ao  cais Pharoux  no centro do RJ e embarca no hidroavião Junkers G-24 da Condor, com destino a POA onde explodia a Revolução de 30 que levaria Getúlio Vargas ao poder. A aeronave dispunha de 3 motores de 110 cavalos cada e  voava com a velocidade de 180 km/h, mas,  obrigada pelo mau tempo, voaria a, ou melhor deslizaria sobre as águas a 40, 50 quilômetros horários.

Voo  tinha  duração prevista de 8 horas, incluídas as escalas em Santos e Floripa. Às 3 e meia da tarde estaria pousando nas águas do Guaíba, centro de POA. Pilotava o hidroavião comandante alemão Heinz Puetz que, devido às condições climáticas, obrigava-se a voar pouco mais de 50 metros de altitude! Nove passageiro a bordo lotavam a pequena aeronave. Até Santos, 300 quilômetros distante, normalmente menos de 2 horas de voo, foram quase 4 longas e sofridas horas.

Reabastecida a aeronave decolam rumo a Floripa, mas, 150 quilômetros depois, nevoeiro fecha e são obrigados a pousar em Iguape,  entre a ilha Comprida e o continente. Os  59 quilômetros seguintes são vencidos com o hidroavião esquiando os flutuadores sobre as águas do  canal. 

Perto  do meio dia a neblina desce ao nível das águas tornando impossível ver além de 5 metros do bico da aeronave. Motores desligados, flutuam por 4 horas diante de Cananeia e seus dois canhões coloniais apontados para o mar; impossível prosseguir viagem. Aparentemente, ninguém a bordo sabia que o país estava à  beira de uma revolução. Chatô trocava ideias com seu vizinho de assento, o industrial e engenheiro  

Luís Betim Paes Leme. Era conversa interminável sobre o papel do carvão na siderurgia brasileira. 

UMA VIAGEM AÉREA (QUASE)  ATÉ POA, ANOS 30 

Às 3 da tarde, quando deveriam estar sobrevoando POA a aeronave decola. Puetz informa, contudo, que voariam até Paranaguá, 70 quilômetros ao sul onde pernoitariam. Caia garoa fina de céu encoberto por nuvens Pela manhã prosseguiriam viagem até Florianópolis. Em Paranaguá onde jantou grandes camarões fritos, não ouviu qualquer notícia sobre a revolução. Teria sido abortada? CHATÔ não sabia, mas naquele exato momento, POA  já se achava em mãos  rebeldes. As 5,30 horas da tarde, Osvaldo Aranha, José Antonio Flores da Cunha mais 50 homens fortemente armados tinham tomado de assalto o  quartel-general da 3ª Região Militar gaúcha. Após luta intensa, quartel e o maior arsenal do exército no sul do país caem em mãos dos rebeldes. Em Belo Horizonte não foi diferente. Apenas na Paraíba, por equívoco de comunicação, a revolução começa no dia 4 de outubro, quando Juárez Távora toma o quartel do22º Batalhão de Infantaria.

No RJ, alheios aos fatos, parlamentares discutem abobrinhas no Palácio Tiradentes. Já Washington Luís decretava a prisão de CHATÔ, que (era sabido), fugira para o sul. A imprensa  estaria censurada de 4 a 24 de outubro, os exatos 20 dias de duração do golpe de 30. 3.162

Por Henrique Packter 29/08/2020 - 10:13

Seguem caminhões às 6 horas da manhã alcançando Urussanga às 10, onde entram, apreendendo algumas armas da PM. Prendem o capitão Mello da Força Pública, comandante do destacamento de cinco homens. Pelas más condições da Estrada de rodagem, continuam a marcha por ferrovia. De trem em Urussanga, seguem para Tubarão, chegando às 5 horas da tarde, tomando tudo sem oposição alguma. Capitão Trifino fica na estação da Estrada de Ferro e Ernesto com mais 8 homens vão à Prefeitura onde o Prefeito Otto Feuerschuette e auxiliares aguardavam para entrega das chaves da cidade. Após as formalidades usuais nomeadas as autoridades, demite-se da ação militar. (Esta data também marca a retirada de OTTO para sua fazenda, período que se estende até 1935. Na fazenda, OTTO recebe intimação para entregar 3 reses destinadas à alimentação das tropas revolucionárias, animais escolhidos a dedo pelos militares, na fazenda Campestre e levadas para abate. Ernesto Lacombe informado, constatou a excelente qualidade do gado e mandou devolvê-lo, declarando: devolvo ao Dr. OTTO os animais; são de qualidade para exposição e não para serem abatidas. Otto foi o segundo médico em  Tubarão e o primeiro  tubaronense a formar-se em Medicina e voltar à terrinha.

LACOMBE X TRIFINO

Em manifesto, LACOMBE procura esclarecer o relacionamento problemático com TRIFINO e o motivo das discórdias entre ambos.

“Desde meu primeiro contato com Trifino Corrêa, verifiquei que ele não tinha competência militar, educação necessária, nem era portador de conduta ilibada como seu posto exigia. Dada a influência que conquistei quando da campanha eleitoral da Aliança Liberal nos municípios do sul, só a mim queriam obedecer as forças que estavam se formando e as que se haviam já incorporado desde Araranguá. Não querendo eu estabelecer qualquer conflito de mando e justamente porque meu objetivo era bem mais elevado do que obter glórias esparsas, agradeci aos amigos o pedido que me faziam de comandar as colunas em organização, deixei que capitão Trifino agisse livremente.

Começa em Tubarão a série de disparates e erros de Trifino Corrêa. Em documento imperioso, escrito pelo coronel João Alberto, se ordenava a Trifino que as forças invasoras marchassem sempre desde a tomada de Araranguá até ocupar a Garganta de Anitápolis, sem preocupação da retaguarda. Trifino, entretanto, desobedecendo essas ordens julgou mais acertado ficar em Tubarão, e por dois dias estacionou completamente.

Numa exposição ao coronel João Alberto e ao General Miguel Costa, frisei a necessidade imperiosa de ocupar imediatamente Laguna e Imbituba, logo depois de tomarmos Tubarão. Trifino se opôs a isso dizendo que só tinha instruções para tomar a Garganta de Anitápolis.

Na tarde de 4.10 corre a notícia de que destroier se aproximava de Imbituba para desembarcar 300 homens. Trifino, incontinente, manda tropa, já diminuída para 30 homens, embarcar no trem e pernoitar a 4 km da cidade, dentro dos vagões, abandonando a ótima posição tomada e permanece durante a noite sem ficar exposta a qualquer inimigo.
Entram em Tubarão com apenas 29 homens porque Trifino Corrêa, quando do embarque em Urussanga, onde eram 50, mandou voltar quatro caminhões com vinte e um homens, para, segundo dizia, requisitar nas colônias!

Entram em Tubarão com apenas 29 homens porque Trifino Corrêa, quando do embarque em Urussanga, onde eram 50, mandou voltar quatro caminhões com vinte e um homens, para, segundo dizia, requisitar nas colônias!

Por Henrique Packter 25/08/2020 - 08:44 Atualizado em 25/08/2020 - 08:52

A REVOLUÇÃO DE 30

Movimento armado de 3.10.1930, liderado por MG, PB e RS, terminou com a deposição do presidente da República Washington Luís em 24.10.1930, impedindo a posse do presidente eleito Júlio Prestes e pondo fim à República Velha. A revolução de 30 durou 21 dias.

A quebra da Bolsa de Nova Iorque (outubro de 1929), detona crise econômica em escala mundial, esmagando todas as economias participativas do mercado internacional, caso do café brasileiro.  Em 1929, lideranças oligárquicas paulistas rompem a aliança com os mineiros (a política do café com leite), e indicam o paulista Júlio Prestes candidato à presidência da República. Diante isso, o presidente de MG, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada passa a apoiar a candidatura oposicionista do gaúcho Getúlio Vargas.

Realizam-se em 1.3.1930 as eleições para presidência da República vitoriando-se o candidato governista,  presidente  de SP, Júlio Prestes. Não chega a  tomar posse em virtude do golpe de estado de 3.10.1930. Exilado, Júlio Prestes foi o único político eleito presidente do Brasil pelo voto popular, impedido de tomar posse. Getúlio Vargas assume a chefia do Governo Provisório em 3.11.1930, data que assinala o fim da República Velha no Brasil.

CHATÔ, O REI DO BRASI (Fernando Morais), prosas no CAFÉ SÃO PAULO e ERNESTO LACOMBE

Ernesto Lacombe, 51 anos em 1930, 71 anos em 1951 ao falecer (Jaguarão, 29.6.1879 – Criciúma, 14.2.1951), industrial, jornalista e político, mudou-se para Tubarão, onde montou charqueada e fábrica de banha, morando com a família na Fazenda Revoredo. Dirigiu em Tubarão O Liberal. Getulista, propagava antes da Revolução de 30 as ideias da Aliança Liberal.

ÚNICO DOCUMENTO DA INVASÃO DO SUL CATARINENSE PELO LESTE, ESCRITO POR SEU CHEFE

Ernesto Lacombe redigiu, logo após a revolução, o manifesto Invasão de SC pelo Setor Leste. Seria o único documento existente sobre o assunto (Este meu Tubarão …! Walter Zumblick, 1º Vol. Edição do autor, Tubarão, 1974).

A REVOLUÇÃO EM CRICIÚMA

Em 10.10.1930, cinco dias após tomar posse como prefeito de Criciúma e uma semana após eclodir a revolução de 30, Cincinato Naspolini enviou correspondência aos munícipes, requisitando material de consumo, veículos e outros. Documentos da época reclamam das condições em que veículos foram devolvidos a seus donos (Gregório Michels, em 10.10.1930, relaciona as peças levadas de seu Ford typo A, total de 847 mil réis). Egydio A. da Silva, de São Bento Baixo, teve requisitado seu caminhão Ford número 10 para transporte de tropa de Torres a Araranguá. Santi Vaccari, governador civil em Araranguá, escreveu em 19.10.1930, no verso do documento que requisitava o caminhão, carregado para o norte do estado, pelo capitão Otelo Frota, comandante da Legião Osvaldo Aranha,

Também Henrique Waterkemper, de São Bento Baixo, teve seu automóvel Chevrolet requisitado, assim como Basílio Aguiar, de Nova Veneza, que emprestou seu caminhão Chevrolet com cabine, 6 cilindros, placa número 15 e Giácomo Búrigo, de Mãe Luzia, que perdeu o caminhão Chevrolet, modelo 1929, placa número 10. Em 12.10 requisitou-se 311,5 caixas de gasolina, 14 galões de óleo à Standard Oil Company of Brazil de Criciúma.

João Targhetta, proprietário do Hotel Brasil, teve pendurada conta de mais de trezentos e vinte mil réis, hospedagem de revolucionários. Calote também contemplou os hoteleiros Lodetti (Café São Paulo) e Angeloni.

Prefeito Cincinato Naspolini em duas folhas de papel almaço ordenou as dívidas que deveriam ser quitadas pela municipalidade e que somavam pequena fortuna. 3530

Por Henrique Packter 18/08/2020 - 08:10

Henrique Dauro Martignago no Café São Paulo

Na sua biografia autorizada, HENRIQUE DAURO MARTIGNAGO faz referência a roubo e a contos do vigário que levaram joalharias da cidade a prejuízos ruinosos. Roubos verificados em Criciúma nesses estabelecimentos  foram vários nos anos 60, alguns com  desfecho feliz, como aquele  sofrido pela desaparecida Óptica Rosil, da rua 6 de janeiro.  (RO do Rosil é de Rui Vante Rovaris e Sil é de Primo  Silvestre). A mãe de um dos proprietários da óptica, afanada em joias e relógios, ouviu de dona de Pensão  que indivíduo suspeito lá se hospedara com uma daquelas malas de papelão marrom,  então comuns entre pessoas mais carentes. Vante vai lá e recupera joias e relógios surripiados.

Já outros nunca se recuperaram econômica e/ou emocionalmente de afanos, como Valmor Crema, com comércio de joias (1964 a 1992). O roubo executado pelo telhado, acesso facilitado pela ausência de forro concretado, levou o proprietário a encerrar os negócios. Outros se deram bem graças a bons padrinhos. É o caso de Gilson da Silva,  motorista da família Guglielmi por cinco anos. Os recursos que obteve rescindindo contrato de trabalho com os Guglielmi permitiu que adquirisse instrumental e material suficiente para criar a Juner (1981). Em  1982 com a ajuda de Reginaldo Guglielmi estabeleceu-se  na Travessa Padre Pedro Baldoncini.  Vai estudar Direito na ULBRA em Torres, RS. Auxiliado por ADHEMAR PALADINI GHISI, grande político catarinense e depois Ministro e Presidente do Tribunal de Contas da União, transfere-se para a UNISUL de Araranguá, formando-se em  2002.

Há pouco tempo SC lamentava o falecimento de Alcidino Eduardo Fernandes, fundador das Ópticas Alcidino. De começo modesto em Santa Rosa do Sul, SC (1961), já em 1969 está com  loja em Araranguá  e a 26.10.1976 em Criciúma. Desde os difíceis tempos iniciais têm como gerente em Criciúma, Paulo da Rosa. As lojas (fevereiro de 1982) alcançam Tubarão (gerente Eliane da R. Fernandes), e em 1989 com a inauguração do Shopping Della nele inauguram outra Óptica em Criciúma, cuidada pela outra filha, Elizane. Em 1989 a primeira-loja em Santa Rosa é desativada e transferida para Sombrio.Com a abertura de outra loja em Florianópolis já são 7 as Ópticas Alcidino.

Em 1954 Osvaldo Silvestre instala-se com Joalharia, Relojoaria e Óptica passando a loja para o irmão Altino (1978).

Óptica Pioneira

Muitas outras ópticas se  instalaram entre nós, mas, qual teria sido a primeira de todas?

A RELOJOARIA DE DONA LIDUÍNA  ZAPPELLINI, no longínquo ano de 1939. Era mãe de Dona Idalina, sempre tratada como Vita. Em 1935,  Affonso Silvestre casado com Liduína Zappellini,  muda-se de Orleans para Criciúma. Em 1958 a viúva Liduína vende a joalharia, relojoaria e óptica aos cunhados Altino, Felisberto (Félix) e Carmela. Félix logo sai. Altino segue o negócio com o sobrinho Valmor Carrer, filho de Carmela. Valmor e Félix  falecem prematuramente. Affonso nascido em Canela Grande, Tubarão (1907), vem a morrer em Criciúma em 4.7.1948 aos 41 anos.

A família Silvestre nos anos 60 liderava o comércio de joias, relógios e de óptica em Criciúma com, pelo menos , quatro estabelecimentos do gênero. Todo esse pessoal, profissionais joalheiros, relojoeiros e ópticos, gravitavam em torno do Café São Paulo e do Café Rio. Suas lojas estavam na Conselheiro João Zanette, 6 de janeiro, João Pessoa (início), Travessa Padre Pedro Baldoncini (início). No pico do horário comercial não arredavam pé de seus negócios; mal o movimento aquietava,  corriam ao Café São Paulo para saber das últimas.

Estas notas nada têm a ver com as histórias contadas por Henrique Dauro Martignago e registradas pela filha,  Dra. Gabriela Gorini Martignago. Trata-se de rumoroso caso dos anos 60, envolvendo o comércio de joias em nossa cidade e que breve contarei.

Por Henrique Packter 11/08/2020 - 10:10

Em 28.10.2010 DAURO presenteou-me com o livro CRICIÚMA: EVOLUÇÃO E SUCESSO. Trata-se de narrativa autobiográfica relatada  à filha Gabriela Gorini Martignago Coral, ex-juíza de Direito, autora da obra.

Quando trata da colonização italiana, a partir da página 35, Dauro descreve a ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA EM CRICIÚMA embora sem demorar-se em datar dados relativos a este aspecto político. Cita o cemitério da cidade que se situava no mesmo local onde, mais tarde, Abílio Paulo construiria  o prédio do  Café São Paulo. Ponto de encontro e de decisões históricas desde a década de 30, o Café São Paulo fecha as portas em 5.9.2007. O edifício Filhinho foi construído em 1946, e é um dos exemplares originais arquitetônicos da época que mais preservam sua característica, hoje referência na cidade.

Localizado na esquina das ruas 6 de janeiro e Conselheiro João Zanette, antes da construção do edifício, o Café São Paulo já existia desde a década de 1920 numa casa no mesmo local, há mais de 80 anos. Propriedade de Henrique Lodetti, este a vendeu para Abílio Paulo, que decidiu pela demolição da casa e construção do edifício Filhinho. O Café São Paulo se manteve no local, ocupando o andar térreo.

Num dos andares superiores, em agosto de 1947, foi instalada central com 50 aparelhos para instalação da primeira rede telefônica em Criciúma. No outro andar, logo após o término da construção, nasceu a Rádio Eldorado. As atividades da rádio acontecem nos altos do Café São Paulo até 1955, quando, adquirida por Diomício Freitas foi transferida para o edifício São Joaquim.

Os cafés São Paulo e Rio eram locais de encontro diário dos trabalhadores, comerciantes, juízes, médicos, advogados, engenheiros e recém-chegados à cidade. Era ali que notícias e informações se espalhavam, e ali, na Praça Nereu Ramos e nos prédios do entorno, todo o processo de expansão, de articulação de apropriação e de identificação acontecem. Desnecessário falar da importância do núcleo inicial de uma cidade e seu processo de desenvolvimento. No centro da cidade está sua primeira área urbana, e é através dela que surgem suas primeiras manifestações históricas, sociais, culturais, políticas, atividades de encontro, lazer, espaços de contemplação.

CONTOS DO VIGÁRIO

A cidade sempre teve seus vigaristas. Alguns executavam golpes mais elaborados, outros eram simples assaltantes. Talvez o mais célebre desses vigaristas tenha sido o Doutorzinho responsável por várias façanhas, sobretudo logo após o movimento militar de 1964. Aproveitando-se do temor da população daqueles dias, apavorada  pelos vizinhos sumidos na calada das noites, levados para prisão, submetidos a  interrogatórios, Doutorzinho geralmente usava fardas militares de coronel fazendo-se acompanhar por cúmplice, um major ou capitão fictício.

Trajados dessa maneira assaltaram seu Teixeira, gerente local da Força e Luz criciumense. Dauro descreve o assalto noturno à casa do idoso cidadão. Divorciado, por questões de repartição dos bens não tinha propriedades imóveis em seu nome, somente moedas estrangeiras rentáveis e joias,  no cofre da moradia. Coronel Doutorzinho é recebido pelo dono da casa, arma em punho. Consegue dissuadi-lo e Teixeira guarda a arma, chama a segunda esposa de sobrenome Gaidzinski para auxiliá-lo. Os militares queriam ver os dólares, supostamente falsificados e que escondia em casa para levá-los à delegacia de polícia onde seriam examinados pelo delegado Helvídio de Castro Veloso Filho. Embarcam no jipe militar de onde Teixeira é arrojado quando se achavam longe da cidade, proximidades de Maracajá. Os ladrões levaram consigo duas fronhas de travesseiro repletas de dólares americanos.   

Segundo Dauro os fatos foram comemorados pelo baixo, médio e alto submundo da cidade no Café São Paulo (pág. 83). Um dos comparsas teria comentado a respeito do assalto ao gerente da Força Elétrica:

- Cobrou em quilowatts e perdeu em quilates!

Por Henrique Packter 06/08/2020 - 09:33

Saí do Banco Inco livre, leve e solto. Então, o tão temido sistema bancário brasileiro era só isso? Mas era uma coisa maravilhosa, a bondade personificada! Terminado o pagamento de minha dívida bancária muitos meses depois,  voltei ao Banco para agradecer a Francisco Corbetta pelo acolhimento, pela concessão do empréstimo de maneira tão humana, tão cordial, sem maiores burocracias.

- Não me agradeça, agradeça a Fidelis Barato!

Caí das nuvens! Claro, àquela altura eu já sabia quem era Fidelis Barato. Natural de Jaraguá do Sul, nascido em 1930, teria portanto à época 30 anos de idade. Casado com Dona Idalina Silvestre (Dona Vita), residia em Criciúma desde 1947. Era contabilista.  Foi diretor da Companhia Carbonífera Catarinense S.A., do Expresso Coletivo Forquilhinha Ltda., do Expresso Rio Maina Ltda., e do Transporte Coletivo São Marcos Ltda. Presidiu o Conselho Deliberativo da SATC. Participava da política (PSD, ARENA, PDS). Vereador de 1960-1972  e presidente da edilidade,  Cidadão Honorário de Criciúma, faleceu em POA (1º.7.1986 aos 56 anos), após laringectomia, cirurgia para remover um câncer de laringe. Corbetta explicou porque eu deveria agradecer  a Fidélis.

- Ele estava atrás de ti quando vieste pedir o empréstimo. Fez um sinal claro que era para emprestar o dinheiro, ele seria avalista. Confidenciou-me ao assinar a papelada do contrato que ficara impressionado com tua magreza vestida de roupas tão baratas.

Nesse ano de 1960, a 27 de janeiro faleceu Osvaldo Aranha, grande político brasileiro e a  21 de março nascia o piloto da Fórmula 1, Ayrton Senna. Foi um ano cheio de novidades. A 1º de janeiro era  lançado o jornal a Folha de São Paulo e a 25 de fevereiro um DC3 da Real Transportes Aéreos chocou-se com um DC-6 da marinha dos EUA sobre a cidade de RJ, precipitando-se sobre a Baia Da Guanabara, matando todas as 66 pessoas a bordo. A 21 de abril o presidente JK declarava inaugurada Brasília, a nova capital brasileira, no novo DF, substituindo o RJ o qual  ficava compreendido no novo estado da Guanabara. A 19 de novembro o pugilista Eder Jofre tornou-se campeão mundial dos pesos galo da Associação Mundial de Boxe ao vencer Eloy Sanchez,  campeão mexicano, em Los Angeles (EUA).  2225

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