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[Vídeo] Apostas online: o vício silencioso que destrói vidas e desafia a legislação

Apostador em tratamento e especialistas revelam o impacto das plataformas digitais e expõem lacunas na proteção ao consumidor

Por Fernanda Zampoli e Sophia Rabelo 22/10/2025 - 08:01 Atualizado há 3 horas
Foto: Sophia Rabelo/ 4oito
Foto: Sophia Rabelo/ 4oito

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Joel da Rosa Elia Júnior, 31 anos, estudante universitário e gerente comercial, conheceu as apostas esportivas no auge da pandemia, em 2020. Torcedor do Criciúma, ele começou com apostas pequenas (R$ 20, R$ 30) motivado por vídeos nas redes sociais e pela onda de influenciadores digitais que promoviam “métodos infalíveis” para lucrar em jogos.“Comecei apostando no time que eu gostava. No início, eram valores baixos, mas fui aumentando até apostar R$ 500, R$ 1.000 de uma vez”, lembra Joel. Apesar de alguns ganhos esporádicos, nunca teve lucro real. Com o tempo, as apostas deixaram de ser lazer e se tornaram rotina.

Assista: Joel relata como as apostas se tornaram um vício invisível


Do esporte ao cassino: a queda silenciosa
Em 2022, Joel conheceu os cassinos online. Em uma das primeiras tentativas, apostou R$ 2 e ganhou R$ 500.“Foi rápido demais e a sensação foi muito forte. Aí foi só para baixo.” A facilidade de fazer depósitos pelo celular acelerou o vício. “Você faz tudo em segundos, sem sair de casa, diferente da lotérica, que ainda exige algum esforço. Apostar virou automático”, relatou. A vida financeira desandou.

Joel gastava salários inteiros, pegava dinheiro emprestado e usava sua reputação para conseguir crédito com familiares. Estima prejuízo superior a R$ 100 mil. O impacto emocional foi ainda maior: afastamento da família, vergonha, mudança de comportamento, depressão e tentativas de suicídio.“Minha vida era a aposta. A energia que eu tinha, eu gastava para apostar. E eu tinha mais felicidade na expectativa de ganhar do que no ganho em si", comentou.

 Assista: Como o celular virou o principal gatilho do vício

Quando o fundo do poço vira o começo da recuperação
A virada veio após a esposa descobrir as apostas no celular. Joel precisou admitir o problema. O apoio veio, principalmente, do pai. “Ele me abraçou e disse: ‘Essa é uma que a gente vai passar junto’. Isso me segurou", detalhou. 

Hoje, Joel está em tratamento psicológico e psiquiátrico há mais de um ano. Um dos primeiros passos foi abrir mão do celular por seis meses, decisão difícil, mas necessária para romper o ciclo da dependência.“É tudo feito para te perder: as cores, os sons, a velocidade. É uma loucura. O efeito no cérebro é comparável ao da cocaína", revelou. Com o apoio da família, Joel recuperou parte do patrimônio perdido e reorganizou a vida. O controle financeiro agora está nas mãos da esposa. “Procure ajuda. Fale com a família, mesmo que tenha julgamento. Não espere chegar no ponto fatal", aconselhou.

“A dopamina do jogo vicia como a droga”: o alerta da psicologia

O psicólogo Bruno da Silva da Silveira, professor da Unesc e especialista em dependência comportamental, explica que o vício em apostas online é uma forma de dependência química sem substância, mas com os mesmos efeitos cerebrais.“A maior felicidade não está no ganho, mas na expectativa. É esse momento de incerteza que libera o pico de dopamina no cérebro. Isso gera um ciclo vicioso tão potente quanto o da cocaína", salientou.

Bruno alerta que a dinâmica digital, velocidade, privacidade, facilidade, torna tudo mais perigoso. “As pessoas perdem a noção do tempo e do dinheiro. Negam o problema e continuam apostando para recuperar perdas. O tratamento exige acompanhamento multidisciplinar e apoio familiar. A prevenção precisa começar com educação e restrição à publicidade para públicos vulneráveis", frisou.

 Assista: Psicólogo explica como o cérebro responde ao vício em jogos digitais


Aposta legal, vício invisível: o que diz a lei
A regulamentação das apostas de quota fixa no Brasil existe desde 2018. Mas foi só com a Lei 14.790, de 2023, que o Ministério da Fazenda passou a autorizar e fiscalizar as plataformas.

Segundo o advogado Israel Rocha Alves, especialista em Direito do Consumidor, existem dois tipos principais de apostas: as que envolvem competidores reais, como jogos de futebol, e as que dependem de algoritmos, como os chamados "jogos de tigrinho". “Ambos são considerados jogos de sorte e precisam ser auditados, mas o que preocupa é a publicidade: muitas vezes agressiva, sem aviso sobre os riscos, e voltada a jovens", explicou.

Alves lembra que, por lei, o apostador é considerado consumidor, mas essa proteção, na prática, ainda é falha.“A legislação não exige que o influenciador diga, por exemplo, a chance real de ganhar. Não há obrigação de alerta sobre o risco de dependência e isso é um grave problema", aponta.

Para o advogado, seria necessária uma revisão legal, com critérios mais rígidos para publicidade, semelhantes aos de bebidas alcoólicas e cigarro.

 Assista: Israel Rocha Alves explica o que a lei protege — e o que ainda deixa desprotegido
 

Um vício que desafia o sistema
O crescimento das apostas online no Brasil desafia a legislação, a saúde pública e o sistema de proteção ao consumidor e faz vítimas silenciosas. Joel, agora em recuperação, faz questão de deixar um alerta: “Quem ganha com isso é a influência. Não a gente. É um vício, é uma doença. Por isso eu falo: procure ajuda. Não espere perder tudo", reforçou. 

 Assista: A mensagem final de Joel a quem enfrenta o vício em jogos digitais
 

Panorama do mercado regulado de apostas no Brasil

17,7 milhões de brasileiros apostaram no 1º semestre de 2025

78 empresas autorizadas e monitoradas pela Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA-MF)

R$ 17,4 bilhões em receita bruta (GGR) no período

R$ 983 foi o gasto médio por apostador ativo no semestre

Ações de fiscalização e combate ao mercado ilegal

Bloqueio de sites:  15.463 páginas retiradas do ar (Anatel)
Fiscalização financeira: 277 comunicações de suspeitas / 255 contas encerradas
Publicidade irregular: 112 páginas e 146 publicações removidas nas redes sociais

66 processos de fiscalização envolvendo 93 bets

35 resultaram em sanções no semestre

Cooperação com Banco Central, Google, Meta, TikTok, Kwai e Amazon

Perfil dos apostadores

Faixa etária | Percentual |
31 a 40 anos | 27,8%     
 18 a 25 anos | 22,4%      
 25 a 30 anos | 22,2%      
41 a 50 anos | 16,9%      
51 a 60 anos | 7,8%       
 61 a 70 anos | 2,1%       

  • 71% dos apostadores são homens

  • 28,9% são mulheres 

Arrecadação e impactos econômicos

R$ 3,8 bilhões arrecadados em tributos federais no semestre

Inclui IRPJ, CSLL, PIS/Cofins, Contribuição Previdenciária

R$ 2,14 bilhões destinados a áreas sociais (Lei 14.790/23)

R$ 2,2 bilhões em outorgas e R$ 50 milhões em taxas de fiscalização recolhidos pela SPA-MF

Bolsa Família e BPC não poderão ser usados em apostas online

Em 01 de outubro, o Ministério da Fazenda estabeleceu regras para impedir uso de benefícios em sites de apostas, seguindo decisão do STF

O que muda:

Beneficiários do Bolsa Família e do BPC não poderão usar os recursos em sites de apostas.

Plataformas têm 30 dias para implementar bloqueios.

Consultas devem ser feitas a cada 15 dias no Sistema de Gestão de Apostas do Ministério da Fazenda.

Procedimentos:

Cadastro de novos usuários: se constar como beneficiário, é negado.

Usuários já cadastrados: conta deve ser encerrada em até 72 horas após identificação.

O bloqueio permanece enquanto o usuário estiver ativo nos programas sociais.

Dados relevantes:

Em 2024, beneficiários do Bolsa Família gastaram mais de R$ 3 bilhões em apostas via Pix.

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