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Camille Bertault e a deusa Música

Ela possui uma vasta ligação com a música brasileira
Clairton Rosado* 04/04/2024 - 09:33 Atualizado em 04/04/2024 - 10:03

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Os versos da canção “Palco” de Gilberto Gil são tradutores do universo musical vivido por todo aquele que se conecta à sacralidade sensorial sonora que um ambiente como o palco poderá propiciar. A “aura clara (que) só quem é clarividente pode ver” surgida ali através de uma entrega dinonisíaca sob o derramamento de um bálsamo enviado pela deusa Música, capaz de “fazer o canto, cântaro cantar” só nos é acessível quando também estamos abertos a essa conexão, mas sobretudo, quando o intérprete se dispõe a vivenciar isso em sua plenitude. Reside aí um dos grandes desafios de todo músico: entrega e transmutação para a transformação da vida, no caso, a nossa. 

Camille Bertault, a cantora francesa que transcende rótulos e gêneros musicais, é um daqueles casos que torna difícil responder ser ela a agraciada por receber tal bálsamo, ou mesmo se seria ela o próprio bálsamo. O fato é que não há nada além de música e transcendência quando sua presença é conectada ao espaço sagrado do palco, que no caso de Camille vem a ser todo lugar onde ela estiver a cantar. A música parece estar sempre à sua espera em busca de clarividência. Em suas interpretações a voz muitas vezes se confunde a um instrumento musical agraciado pela possibilidade de emitir palavras em primorosa e impressionante execução instrumental, como na composição “Là oú tu vas” do álbum “Pas de Geant” em que ela transmuta em si “Giant Steps” de John Coltrane.

Em “Bonjour mon amour”, álbum de 2023, a sonoridade jazzística está lá como horizonte cujas fronteiras são continuamente expandidas com a delicadeza de quem serve à música, mas não se prende aos gêneros que lhe possam ser limitantes. Se na canção “Dodo” ouvimos o ritmo e ruídez presentes na força que a palavra possui em sua pronúncia quase crua, “Conne, finement” permite uma voz que passeia divertidamente através de melodias e harmonias que vagueiam sobre o ritmo estabelecido do acompanhamento. Mas o jazz está lá, em “Acrécan” Camille se lança a improvisos vocais que a incorporam à textura da banda, logo distintos pelos vais e vens a uma sonoridade próxima da fala. “Un grain de sable” e “Voir la mer” completam a sonoridade jazzístíca do álbum sob incorporações que as levam para além do jazz, como a sonoridade percussiva argentina que Camille absorve com naturalidade.

Outras sonoridades não são novidade para Camille. Ela possui uma vasta ligação com a música brasileira na qual constam colaborações com João Bosco, Guinga, Trio Corrente, Hamilton de Holanda, dentre outros. Mas cabe aqui o destaque para uma em especial, a gravação de “Nuvem Negra” com Mestrinho. Além da relação Brasil e França, unida pela sonoridade do acordeon, instrumento definidor de sonoridades características em ambos países, a canção de Djavan harmonizada por Mestrinho, o sergipano herdeiro do legado de Dominguinhos em tantas amplitudes que sua música possui. Camille percorre assim caminhos que nos levam à festa daqueles que “têm na testa o deus Sol como um sinal”. Música, alma e aura clara. Passos gigantescos que nos trazem “um cesto de alegrias de quintal”.

*Clairton Rosado é Doutor em Música e Programador musical da Rádio Som Maior FM.

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