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Reportagem Especial

Mais que um trilho: Ferrovia Tereza Cristina é legado de gerações

Além do transporte de cargas, estrada de ferro do Sul catarinense contribui em projetos de cunho socioambiental e desenvolve ações em prol das comunidades lindeiras
Letícia Cardoso e Monique Amboni Criciúma, SC, 13/07/2023 - 11:49
Foto: Divulgação/ FTC
Foto: Divulgação/ FTC

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Em 34 anos na linha férrea, Ronaldo Gonçalves de Fari percorreu as mais variadas áreas, em certos momentos chegou a seguir os passos do pai. No início dos anos 2000, ele iniciou no Centro de Controle Operacional, como controlador do tráfego ferroviário. “Em 2005 surgiu a oportunidade como maquinista. Essa função, que meu pai também trabalhou, eu admirava muito, onde eu trabalhei por cinco anos”, conta o supervisor. Depois de cinco anos, ele foi realocado para supervisionar a estação. “Em 2016 eu entrei como supervisor de operações, essa foi a mesma função que o meu pai se aposentou. Então, eu achei muito importante quando alcancei o mesmo objetivo que o meu pai teve”. Já faz um ano que Ronaldo está no cargo de supervisor de planejamento e transporte.

A Ferrovia Tereza Cristina tem sua operação gerida por 297 colaboradores. Alguns acreditam que a estrada de ferro tornou-se mais que um trabalho, mas parte da sua vida. Como é o caso do maquinista Ramon Medeiros de Souza, que está há 14 anos na empresa; do supervisor de planejamento de transporte, Ronaldo Fari, que presta mais de 30 anos de serviço, e do coordenador e supervisor da circulação dos trens, Almir Fernandes.

“Graças a Deus consegui entrar, estou até hoje. Eu tenho orgulho de trabalhar na ferrovia por vários motivos da família, e pretendo seguir até a minha aposentadoria”, comenta Souza. Ele só está na ferrovia por conta de seus tios e primos. “Eu entrei aqui já em 2009, com esse propósito daqui não sairei mais, daqui só me aposentando. Aqui foi metade da minha vida. A ferrovia significa tudo para mim”, destaca o maquinista.

Assim como ele, Fari revela que seu primeiro contato com a ferrovia foi através do seu pai, avós, tios e por alguns primos. Com 18 para 19 anos, ele saiu do Exército com a intenção de seguir na carreira de engenharia elétrica. Quando foi morar em Joinville, já estava trabalhando em uma empresa de engenharia e com o propósito de crescer profissionalmente se preparava para um vestibular, porém, nesse momento, seu pai lhe avisou sobre um concurso público aberto pela Rede Ferroviária Federal. “Foi onde eu participei das avaliações, participei dos exames, depois do treinamento. Até que no dia 7 de julho de 1979 eu entrei no quadro da Rede Ferroviária Federal como agente de estação”, relata.

No caso de Fernandes, ele conseguiu uma vaga na estrada de ferro por meio de seu tio, que já trabalhava na ferrovia. Em 2004 iniciou como manobrador, com o passar dos anos conseguiu participar dos treinamentos e das classificatórias, tornando-se um agente de estação. “Eu tinha 22 na época e ali fiquei até 2006. Com a pretensão de fazer dupla cidadania e conhecer um pouco do mundo, eu em acordo com a Ferrovia fiz meu desligamento e fui nessa nova fase”, revela Fernandes. Em 2012, ele retornou ao Brasil e tentou voltar para a função que possuía na ferrovia. Ao conversar com seu tio, que ainda estava na FTC, descobriu que era necessário fazer um novo cadastro, foi quando ele se deslocou para Tubarão para fazer a inscrição.

“Em junho de 2013 fui chamado para vaga em Tubarão, quando me avisaram que estava disponível uma vaga de agente de estação imediatamente me coloquei à disposição, e disse ‘não, não. Quero para amanhã!’”, expõe Fernandes. Na época ele estava cursando engenharia, com o conflito dos horários decidiu largar a faculdade para estar inteiramente à disposição da empresa. “É prazeroso, meu serviço é prazeroso. Ao longo desses 20 anos, para mim aqui dentro foi um crescimento profissional. Eu não me vejo fora daqui, para mim parece que eu nasci para fazer esse serviço que eu faço hoje. Na parte pessoal o que me causa bastante orgulho quando eu estou com meus filhos pequenos, quando a gente está em algum trecho que tem cruzamento do trem, eles olham para o trem e falam ‘ah, o trem do papai, o trem do papai’, aquilo ali então é orgulho de reconhecimento”, enfatiza.

Almir Fernandes nos trilhos da Ferrovia Tereza Cristina no Bairro Milanese, em Criciúma | Foto: Divulgação

[o texto continua após o áudio]

Almir Fernandes fala sobre seu trabalho na FTC:

 

Museus garantem o fortalecimento da história 

Devido à crescente exploração do carvão mineral no sul do país, houve a necessidade de possuir um meio de transporte para levar os minérios do sul de Santa Catarina, principalmente o carvão, até o Porto de Imbituba. E, no dia 1º de setembro de 1884, após quatro anos de construção, foi inaugurada a Estrada de Ferro Donna Thereza Christina, em Tubarão. Nas quatro décadas que sucederam o carregamento, se expandiu para passageiros, animais e outras mercadorias.

Com a necessidade de eternizar as memórias da linha férrea no município e de seus funcionários, foi criado em 1997 o Museu Ferroviário de Tubarão. “Os ferroviários, junto com o doutor José Varmonte Teixeira, médico ferroviário do trabalho, entenderam que aquela época, com a extinção da rede ferroviária federal, muito do acervo ferroviário de Tubarão e região iria ser perdido. A partir de 1997, uma área destinada à oficina de tratamento de dormentes foi escolhida para abrigar o museu ferroviário”, explica a museóloga Silvana Silva de Souza.

Hoje, ele conta com um acervo histórico completo, com mais de 40 mil itens, subdividido em coleções, sendo artes visuais, coleção histórica, documental, bibliográfica, fotográfica, maquinário e memória do trabalho ferroviário. “A coleção de locomotivas a vapor é composta por diferentes modelos, períodos e nacionalidades, sendo a mais relevante do Brasil e da América Latina”, observa a museóloga.

[o texto continua após o áudio]

Silvana Silva de Souza fala sobre o acervo no Museu Ferroviário de Tubarão:

Em 2022, o museu recebeu aproximadamente quatro mil pessoas. Além dos visitantes, a infraestrutura conta com passeios de trem, que nesse mesmo ano registrou 6.134 passagens compradas. As viagens podem durar de três a cinco horas, com apresentações musicais, explicações sobre o maquinário e serviços de bordo.

Construção Original da Casa dos Agentes Ferroviários em 1988 | Foto: Acervo Histórico de Criciúma

Já em Criciúma, como parte do complexo Ferrovia Donna Thereza Christina, foi fundada em 1920 uma casa para os trabalhadores da ferrovia e servia como residência para as famílias dos agentes até 1970. Nela, encontram-se exposições fotográficas com diferentes momentos da Estação Ferroviária, arquivo documental, móveis, objetos de época, ferramentas de trabalho e obras de arte. “Por ser um memorial, ela tem que permanecer em nossa cidade para mostrar às pessoas a importância que a ferrovia tem em Criciúma. Ele remete e resgata as memórias das pessoas que ainda se encontram e que vivem este momento”, ressalta a historiadora da Fundação Cultura de Criciúma, Cinthia Franco de Oliveira Teodoro.

Em 1995 foi demolida, e no início dos anos 2000 finalmente ficou conhecida como Memorial da Casa do Agente Ferroviário Mário Ghisi. Após alguns setores entrarem com ações na Justiça, a construtora responsável pela demolição reconstruiu a casa. Atualmente, o memorial está aberto para visitação de segunda-feira a sexta-feira, das 8h às 12h e das 13h às 17h.

“No começo a ferrovia era somente para o transporte do carvão. Por isso que era de grande importância ter uma ferrovia na cidade. Onde se encontra o amarelinho central é onde se encontrava a ferrovia, ali que se passava a exploração da Próspera e de outros bairros. Com o tempo viu-se a necessidade de ter um transporte também como locomoção de pessoas”, informa a historiadora. Hoje, a FTC não se prende apenas ao transporte do carvão, mas se volta para ações sociais para desenvolvimento socioambiental.

[o texto continua após o vídeo]

Assista à retrospectiva da Estrada de Ferro:

Estrada de ferro movimenta milhões na economia do estado

A estrada de ferro Donna Thereza Christina completa 139 anos de atuação no dia 1º de setembro de 2023. Atualmente, seus trilhos possuem 164 quilômetros de extensão, cortam 14 municípios de Santa Catarina e possuem 17 locomotivas e 554 vagões. Em 31 de janeiro de 1997 a estrada de ferro tornou-se um empreendimento privado, sendo conhecida como Ferrovia Tereza Cristina (FTC). 

Para a região Sul de Santa Catarina, a ferrovia é um fator importante economicamente, que contribui para o meio social e cultural. Desde seus 26 anos de privatização, já arrecadou R$ 297,7 milhões ao Tesouro Nacional como outorga, arrendamento e tributos, e movimenta todos os anos mais de R$ 6 bilhões na economia do estado.

Segundo o gerente de Assuntos Corporativos, Celso Schurhoff, os investimentos para este ano são voltados para a segurança, melhoria de eficiência energética e uso de novas tecnologias na gestão. “Há uma provisão de investimentos diretos de R$ 260 milhões, voltados para a segurança operacional, aumento da malha, ampliação dos ramais de acesso aos clientes e investimentos sociais. Quanto a isso, as especificações ainda estão em análise e posteriormente serão submetidas a audiência pública, para conhecimento de toda sociedade”, relata.

Nesse cenário, com o intuito de reduzir o número de acidentes, até o início de 2023 a FTC investiu mais de R$ 84,7 milhões em melhorias na infraestrutura dos trilhos, promovendo atividades e iniciativas de caráter social com o objetivo de contribuir e desenvolver as comunidades lindeiras (são famílias que se situam ao longo das vias urbanas ou rurais e residem próximo aos trilhos). As cidades que os trilhos percorrem provam a redução nos índices de colisões, dentre elas estão Capivari de Baixo, Cocal do Sul, Criciúma, Forquilhinha, Imbituba, Içara, Jaguaruna, Laguna, Morro da Fumaça, Pescaria Brava, Sangão, Siderópolis, Tubarão e Urussanga. Os investimentos feitos pela malha foram responsáveis por uma redução de 86,76% no número de acidentes.

Caminho que o trem percorre pelo Sul de Santa Catarina | Fonte: Site da Ferrovia Tereza Cristina

E para unir esforços, o Sindicato dos Ferroviários entra em cena

O Sindicato dos Trabalhadores em Empresas Ferroviárias nos Estados do Paraná e Santa Catarina (Sindifer) funciona desde 4 de janeiro de 1963, com o objetivo de defender os interesses e administrar os direitos (condições de vida, de trabalho, segurança no trabalho e valorização dos seus representados) dos empregados em atividade, dos prestadores de serviço, além dos pensionistas e aposentados ferroviários.

“Hoje, a gente representa os trabalhadores da Ferrovia Tereza Cristina, o Locofer e também da Raifer, que são empresas que administram a malha da antiga rede ferroviária federal”, esclarece o presidente da Federação Ferroviária, do Sindicato dos Ferroviários de Tubarão e do Círculo dos Ferroviários, Jerônimo Miranda Neto.

A associação ajuda mais de 15 mil famílias presentes em seus projetos sociais. “O Sindicato dos Ferroviários vem na luta pelas conquistas e os direitos dos trabalhadores, há bastante tempo, participou de todos os movimentos, vários nacionais. Agora o sindicato tem que ser um sindicato cidadão, um sindicato que escute a sociedade, e traga o bem não só para sua categoria, mas no meio em que vive”, pontua Miranda Neto.

Projetos de contribuição social

O Projeto Tração é uma das experiências que a ferrovia traz aos cidadãos, oferecendo o estímulo do ensino dos esportes às futuras gerações, como a desenvoltura do acesso à educação patrimonial, atividades lúdicas e cooperativas e informática. Já a Casa Aberta é um programa voltado ao conhecimento da população para as atividades realizadas dentro da ferrovia.

O Trem do Natal é o foco das celebrações, onde o Papai Noel Ferroviário e seus 40 ajudantes distribuem, ao longo da linha férrea, doces, brinquedos e abraços nas comunidades entre os municípios de Siderópolis e Imbituba. E com o objetivo de trazer oportunidades de primeiras experiências profissionais, a FTC traz os programas de Jovem Aprendiz e Ser Eficiente, com a inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.

*Texto: Letícia Cardoso e Monique Amboni (acadêmicas do curso de Jornalismo do Unisatc – Centro Universitário SATC).

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