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Padre Agenor e Juiz Varella (2 de 3)

Por Henrique Packter 04/09/2023 - 10:00 Atualizado em 04/09/2023 - 11:33

Juiz em várias comarcas do sul catarinense, por onde passou Newton Varella manifestava especial apreço à aviação civil. Muito piloto obteve brevê graças à orientação e ensinamentos de Varelinha. Dentre muitos, pode-se citar: José Francioni de Freitas (o Dite), Adamastor Rocha, Waldir Neves, Frederico (Lila) Casagrande (Criciúma), Omero Clezar, Manoel Salvato (Nelinho), Edgar Orige (Araranguá), José e Aurélio Trento (Urussanga). Prestaram eles significativos serviços à comunidade, com seus pequenos monomotores.

José Trento foi continuador da obra de Varella na região de Urussanga por volta de 1953, quando o juiz deixou aquela Comarca.

Varella ministrava aulas de pilotagem num improvisado campo de pouso em propriedade de Estação Cocal. Na verdade o campo de pouso era pastagem cedida pela família Meneghel, onde, antes de cada procedimento de pouso-decolagem, cumpria ao piloto ou aspirante a, espantar o gado para um só lado do gramado, deixando livre o trilho já definido pelos pneumáticos dos muitos paulistinhas que ali operavam. Quando em terra, taxiava-se pelo pasto para repontar os bichos; se no ar, os rasantes eram a forma de fazê-lo. Com a transferência de Newton e, consequentemente, do eficiente e sempre disponível Rutinha, o modesto aeroclube de Urussanga recebe aparelho que estivera a serviço de instrução em Itajaí. Estava no aro!

Graças aos conhecimentos mecânicos de José e Aurélio Trento, esse potencial gerador de panes foi todo reformado, não sem antes terem alguns destemidos nele voarem, da forma que chegou: motor baleado, fuselagem remendada com adesivos, circuito elétrico comprometido e sistema de combustão deficiente; alguns pontos dos condutos exibiam mechas, usadas para sanar vazamentos. A boia do reservatório de combustível não funcionava. Qualquer varinha servia para medir a gasolina e certificar-se de que havia reserva suficiente para alguns minutos no ar.

Varella era natural de Laguna. Ao se aposentar, estagiou por período considerável como observador brasileiro junto à NASA. Depois de cair 28 vezes, ele, como José Trento, vieram a falecer em acidentes rodoviários... Ironia do destino!

HONRA AO MÉRITO

A Standard Oil do Brasil (ESSO), conhecida multinacional de petróleo e derivados, por anos manteve nas rádios Farroupilha (POA), Tupi (SP), Nacional (RJ), e algumas poucas outras o famoso noticiário Repórter Esso. Herón Domingues, gaúcho de São Gabriel, foi o mais correto apresentador do impecável noticioso de 5 minutos, na Rádio Nacional, além de ter chegado à direção da privilegiada emissora estatal com a saída de Vitor Costa. A ele foi confiado quadro-homenagem do conceituado patrocinador (ESSO), que constituía na outorga periódica de medalhas de ouro de Honra ao Mérito a brasileiros que se destacassem. Foram poucos os aquinhoados com tal distinção pela minu ciosa pesquisa e acuradas análises procedidas aos aspirantes à honraria pela rígida comissão de julgamento.

Newton Varella foi um destaque e talvez, entre os agraciados, o mais citado, especialmente pelo feito que o levou a ser selecionado para a honraria. Mereceu grande destaque no RJ na festa de entrega, frente a autoridades nacionais. Na época, operações aéreas noturnas nessa região simplesmente inexistiam, pela carência de segurança nos campos de pouso, pela precariedade dos próprios equipamentos de voo. O teco-teco, como era conhecido o popular monomotor paulistinha, possuía apenas manche, cabo de aceleração, altímetro e controle de combustível por gravidade. O tanque ficava localizado exatamente à frente do para-brisa, no nariz do avião, com uma boia de cortiça na parte interna do reservat ório, ligada por filete de aço à parte superior externa. Na extremidade superior uma bolinha vermelha (como boia de pesca), marcava a disponibilidade de combustível, na base do olhômetro... Com equipamento dessa categoria, seria humanamente impossível procedimentos de subida ou descida em qualquer aeroporto, durante a noite. Mas, não para Varella, que nunca acreditou no impossível, enquanto pilotava seu avião. De todas as 28 vezes que veio ao solo em queda livre, somente um osso de costela quebrado foi o saldo dos acidentes sofridos. Ria-se, contando até episódios de suas quedas! Ele não soube somente voar; foi exímio também no cair...  Aos discípulos prevenia nas informais aulas teóricas e mesmo em voo: “em caso de pane irreversível, quando a última esperança se anunciar, abra a sanefa e caia fora, faça de conta que voc& ecirc; é composto somente de cabeça e espinha dorsal: proteja essas duas partes da carcaça. O resto deixa quebrar que tem funilaria lá em baixo prá remendar.” Sanefa é a larga faixa de tecido ou madeira que reveste a parte superior de uma cortina.

SOLIDARIEDADE HUMANA

Quando ainda em Urussanga, certa noite, Varella teria sido acordado por mãe aflita, o filho com a traqueia obstruída por semente de melancia. Estaria à beira da morte por asfixia. Não havia na região toda recursos médicos para remoção deste corpo estranho. A alternativa era levar o paciente para Porto Alegre, Curitiba ou São Paulo. Mas, tempo disponível exíguo, cada minuto precioso, daí, a dificuldade em entender o porquê da escolha da distante São Paulo para atendimento àquele problema médico. Porto Alegre, bem mais próxima, tinha recursos para resolver a grave e urgente situação.

GRAVE E SIMILAR CONDIÇÃO, DESTA VEZ EM CRICIÚMA

Lembra-me aqui que passei por problema semelhante no início dos anos 60, quando cheguei a Criciúma. Era um dia de comemoração. Mineiros da Próspera festejavam data com muito churrasco e cerveja. Alguns se excederam no uso de álcool e foi quando um capataz da mineração, foi empurrado e, caindo, teve grave lesão craneana. Não havia, ainda, neurologista ou neurocirurgião na cidade e nem em Florianópolis. Nesta última cidade, em breve, chegaria o neurocirurgião Dr. Livínio Godoi, meu calouro na Faculdade Federal de Medicina de Curitiba, PR, da turma 1960.

Fui chamado para atender o paciente à falta de especialistas na área em Criciúma e arredores. Externamente o paciente não tinha qualquer lesão, mas sua conduta era muito suspeita. Tinha embriagues e estava desacordado, sendo necessário sacudi-lo com energia para que respondesse a estímulos e mesmo a perguntas. Fiz-lhe exame de fundo de olho e assustei-me com o resultado, o acidentado exibia edema de papila, sinal de hipertensão intracraniana e portanto suspeição de hemorragia cerebral. O paciente tinha vômitos.  Indiquei que fosse removido para serviço de Neurocirurgia com a máxima urgência. O avião disponível na cidade era pilotado por Waldir Neves, piloto treinado por Newton Varella. O avi& atilde;o dispunha de dois assentos na frente para Waldir e para mim. Atrás, na cabine, grosso fragmento de madeira na qual viajariam precariamente o acidentado e seu jovem irmão. O pequeno avião dispunha de um localizador bem rudimentar. Acionado, uma seta indicava de onde vinham os sons emitidos pela emissora. Assim, sabíamos onde estávamos. O tempo estava encoberto e não víamos nada, apenas nuvens. A certa altura Waldir disse que estávamos sobre Osório. Tratei de encolher as pernas lembrando dos altos morros que circundavam a cidade. Osório sediava o Aeroclube de Planadores Albatroz. Osório está a 100 km de Porto Alegre.

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