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Doutorzinho e Chumbinho

Por Henrique Packter 08/04/2022 - 09:15

No livro biográfico ditado por Henrique Dauro Martignago, CRICIÚMA, EVOLUÇÃO E SUCESSO, há uma história envolvendo notório vigarista dos anos 50-60 com personagem da sociedade carvoeira e alto funcionário da empresa distribuidora da energia elétrica entre nós. Autor do golpe teria sido o célebre Doutorzinho, personagem marginal de nossa história e que servira no setor de saúde na base da Aeronautica em Canoas, RS.  Dauro esclarece tratar-se de homem de origem alemã, bem apessoado, e que após a baixa viera para Tubarão onde teria exercido ilegalmente a Medicina e até sócio fora no Laboratório de Análises Clínicas de Alfredo Nuernberg! Recebido pela melhor sociedade tubaronense, requisitadíssimo pelas famílias com moças casadouras, frequentava o ambiente hospitalar com desenvoltura.

Era época de revolução de 31 de março de 1964. O medo assaltava todas as pessoas, temerosas de alguma denúncia que levasse pessoas comuns a serem detidas, interrogadas e até a serem presas. Pois não estavam bem vivas nas memórias de todos os casos do Drs. Dauro e Manif; do Vânio Faracco e do Amadeu Luz? Uma noite, altas horas, a população dormindo, um jipe militar estaciona frente à residência de Nelson Teixeira. Dele saem dois militares, um capitão e um tenente. O que queriam eles?

Vinham atrás do Nelson. Ele era desquitado da primeira mulher e, para evitar que seus bens, arduamente conquistados, fossem divididos com sua ex-cara-metade, comprava dólares, joias e coisas assim, fáceis de serem convertidas em moeda corrente, caso necessário fosse. Os militares, foi o que eles disseram, vinham conferir esses haveres, pois alguém denunciara que muitos desses bens seriam falsificações ou (ora, vejam só!), roubadas.

Nelson abriu o cofre e mostrou tudo aos militares que, aparentemente satisfeitos, anunciaram que levariam tudo à delegacia de polícia, onde o delegado Helvídio de Castro Veloso Filho aguardava para lavrar a ocorrência e absolver das falsas acusações um preocupado Nelson Teixeira. Mas, outro foi o destino tomado. Logo Nelson soube que era tudo um golpe, uma vigarice, os meliante abandonando-o sobre a ponte do rio Araranguá.  

O resultado do assalto realizado em Criciúma deveria ser dividido com outros comparsas, coisa que Doutorzinho esqueceu de fazer. Acaba por deixar as  amenidades sociais da vida tubaronense e vai se homiziar em Assunção, Paraguai, onde era proprietário de modesto hotel.

Repercussão no Café São Paulo

Agita-se o café, caixa de ressonância da boataria municipal, com esses assaltos e roubos a joalherias. Da Próspera chegam notícias enigmáticas. Instalara-se no populoso e tradicional bairro criciumense, madame baiana que pregara na porta de sua habilitação-casa de negócio: MANICURE E VIDENTE. Parece que era bastante eficiente nas duas atividades. Segundo sobrinha da mulher do  prefeito, cliente do estabelecimento, ela alertara para outras atividades criminosas do bando, incluindo sequestros e afinal a morte dos cabeças do bando pela Polícia Militar.

Alexandre Herculano de Freitas -, dentista, analista político do café e crítico de trivialidades em geral, avaliava as notícias do dia, atribuindo a cada uma  delas seu peso real. Corria o ano de 1963, último ano de vida de Alexandre que morreria em acidente com seu Candango na localidade de 7 Pontes, próxima a Florianópolis. Também em 1963, a 22/11, o Presidente dos EUA, John F. Kennedy seria assassinado em Dallas no Texas aos 66 anos de idade. A 3/6  morre João 23, talvez o mais extraordinário Papa da Igreja Católica em todos os tempos (1958 a 1963). Morre Édith Piaf, cantora francesa, a 11/10 aos 48 anos. Também morreria Aldou Huxley, escritor inglês, aos 69 anos de idade, autor de Contraponto e Admirável Mundo Novo. 

O juiz Raul Tavares da Cunha Mello prestou depoimento sobre as tropelias do bando de Doutorzinho. Reconheceu que Doutorzinho aproximava-se de autoridades civis para proteção e saber com quem estava o dinheiro.  O conhecimento obtido auxiliava no planejamento dos golpes aplicados. Teria se aproximado de juiz de direito da Comarca do Turvo que dedicava bom tempo das suas horas de lazer à pescaria. Convidado, Egon Schneider acompanhou-o numa delas. Testemunhas dizem que o capitão Doutorzinho pedia ao juiz para espetar  a minhoca na isca porque teria nojo daquele anelídeo.  

Ainda no Turvo, lembra um caso, envolvendo o conhecido criminoso. “Lá no Sul tinha o famoso Doutorzinho, que na época da Revolução se fardava de capitão do exército, adotando o nome de capitão Egon Schneider. Seu comparsa, o Chumbinho, se vestia de tenente. Usavam um jipe verde, roubado, apresentavam-se como militares, agentes da revolução e confiscavam as armas dos colonos, aproveitando-se da ingenuidade daquele bom povo interiorano. Curioso, é que eles eram bem recebidos e até circulavam nas altas rodas da sociedade local. Na verdade, faziam parte de uma quadrilha de roubo de carros, que envolvia até delegados. Com eles, ninguém se metia e muita gente deles sabia. Depois de muitos crimes, a quadrilha se refugiou no Paraguai. Um dos assaltantes era da cidade de Meleiro, no Sul de SC, o Cláudio Casagrande. Houve um desentendimento entre o grupo, porque Casagrande se sentiu lesado pelo Doutorzinho, que teria levado para o Paraguai  todo o dinheiro do assalto por eles praticado.

Tempos depois Cláudio convence Doutorzinho a voltar para SC a fim de participar de outro grande assalto. Na verdade, Casagrande pretendia tocaia-lo, o que conseguiu, terminando por assassinar Doutorzinho e Chumbinho. Este foi enterrado num arrozal e Doutorzinho nas areias da praia do Morro dos Conventos, Araranguá. Quem achou seu corpo foi o então juiz Urbano Salles, quando jogava futebol com grupo de amigos naquela praia. Ao buscar a bola que caíra próximo a umas dunas, acabou encontrando o corpo do criminoso, apenas com a cabeça desenterrada.  Raul acrescenta, ainda, que presidiu o Tribunal do Júri que condenou Casagrande.  

DAURO diz que eles se encontraram com morador de Jundiá no Turvo, na Vila de São João, divisa de SC com RS, onde foram assassinados. Chumbinho foi enterrado próximo à residência onde estava hospedado e Doutorzinho entre Morro dos Conventos e Arroio do Silva. A versão de DAURO é que por coincidência ele, Dino Gorini, Claudio Bratti e Bruno Tasso  caçavam codornas na fazenda de Oscar Réus, no litoral sul.  Um carro fora deixado à beira mar  e, no final da tarde, numa depressão de dunas encontraram cadáver identificado como de Doutorzinho.

Desta forma, terminam tragicamente as vidas terrenas de Doutorzinho e Chumbinho.

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