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O que você faz? Trabalha com quê?

Por Grayce Guglielmi Balod 18/09/2018 - 18:30 Atualizado em 18/09/2018 - 19:01

Grande parte das conversas entre pessoas que ainda não se conhecem começa com o tradicional:
- O que você faz? Trabalha com quê?

Poderia ser nossa deixa para falarmos que curtimos a vida, contemplamos o pôr do sol, tomamos banhos de chuva, dormimos bastante, passamos uma boa parte do tempo livre navegando na internet ou largados no sofá da sala de estar, acompanhamos a sutil diferença da luz do sol enquanto mudam as estações, tomamos muitos cafés, comemos chocolate e gostamos de caminhar sem pressa com nosso cachorro.

Mas quando nos perguntam - O que você faz? - querem saber o que fazemos profissionalmente, que falemos sobre o que nos torna útil na sociedade, sobre o que nos traz retorno financeiro, sobre o popularmente conhecido 'ganha pão'.

Quando nos encontramos nesta situação, em que precisamos falar de nós a partir daquilo que fazemos, nem sempre somos honestos e, as vezes, caímos na armadilha de elaborar um discurso para passar a impressão de que o nosso fazer é importante e com isso ganhar a aprovação de quem nos questiona. 

Falar do que fazemos profissionalmente é falar uma linguagem  universal, sobre a qual todos conseguem opinar e se sentem a vontade para criticar, elogiar, julgar como mais ou menos importante para a sociedade, ou abster-se de fazer comentários mas ficar matutando sobre o que ouviu.

Esta pergunta incomoda mais a medida que estamos mais atentos ao que fizemos. E não estou me referindo ao 'fazeres' profissionais apenas. Refiro-me a atenção que damos à forma como acordamos, aos primeiros pensamentos que nos ocorrem ao despertar, aos nossos primeiros sentimentos, ao modo de levantar da cama, às nossas primeiras escolhas, à roupa que vestimos, ao nosso café da manhã, ao que fizemos com nosso tempo... Porque tudo isto são "fazeres" ou afazeres.

Podemos facilmente perceber a frequência com que as pessoas falam do que fazem; seja na rua, nas filas de espera, no ponto de ônibus, na rodoviária, no aeroporto. Nós as ouvimos falando da empolgação ou do descontentamento que sentem por estarem fazendo o que fazem, de como estão atrasadas para seu compromisso e do que o atraso poderá acarretar, da ansiedade em terminar o horário de expediente e poderem estar com alguém em algum lugar que desejam, de planos e projetos relatados com a ênfase necessária para envolver o outro e fazê-lo comprar sua ideia. 

Talvez por isso as conversas comecem com "o que você faz?" 

 

Num mundo ideal, para mim, conversas entre desconhecidos  poderiam começar com: 
- Quem é você? 

- Como você está? 

- Você quer falar agora? Porque né, às vezes, a pessoa nem quer...

Mas as pessoas, de modo geral, se sentem mais a vontade, e pensam estar deixando o outro mais a vontade, quando perguntam "O que você faz?" 

Possivelmente para muitas pessoas é fácil responder a esta pergunta. "Sou Advogado, Engenheira Civil, Dentista..." 

A pergunta geralmente não é "Quem você é?" mas, se você formou-se em Direito, Engenharia ou Odontologia pode dizer que 'é' advogado, engenheiro ou dentista. Concordemos, porém, ninguém é isso apenas. 

Ninguém é, apenas, o que faz profissionalmente. 

Somos, talvez, a soma de tudo o que fazemos, no trabalho ou fora dele, nos círculos sociais ou quando estamos sozinhos, na presença de pessoas íntimas ou de completos estranhos para nós. 

Nestes diferentes ambientes, temos diferentes tipos de comportamentos  e se pudéssemos abarcá-los todos em nossa resposta à pergunta "o que você faz?" daríamos uma boa amostra de nós mesmos. 

Porém, ainda assim, faltaria tudo o que pensamos, dissemos, deixamos de dizer e de fazer. Faltaria, inclusive, o que desconhecemos sobre nós mesmos.

Tantas vezes nos sentimos inúteis, sem poder fazer nada quando, por exemplo, pegamos uma condução, ou mesmo nosso carro, para voltar às nossas casas no fim do dia e acabamos presos no trânsito. 

Justamente nesta hora estamos fazendo inúmeras coisas: talvez refletindo sobre nosso dia, talvez sonhando com um dia melhor ou diferente, talvez tentando resolver mentalmente o problema que ficou pendente, talvez estejamos nos dando conta de nosso cansaço e de que precisamos relaxar.  Talvez, seja o nosso momento de agradecer a vida que levamos e a oportunidade de fazer o que fazemos. Talvez, seja o raro momento em que  repensamos nossos 'fazeres' mas, mesmo decididos a encontrar outros caminhos, tudo o que podemos fazer, por ora, é seguir em frente. 
Mas como dizer isso a quem nos pergunta:
- O que você faz?

 

Querido leitor, com esta reflexão, quero levá-lo a perceber a oportunidade que temos de conhecer verdadeiramente o outro quando fazemos um primeiro contato, uma primeira pergunta para ele. Oportunidade que podemos desperdiçar quando iniciamos uma conversa focando apenas em saber o que o outro faz, com que o outro trabalha. 
Poderíamos iniciar um movimento mudando a pergunta "O que você faz?"para "O que você fez hoje?"

Porque essa é uma pergunta que parece ser mais fácil de responder e que nos leva a refletir constantemente sobre nossos 'fazeres', permitindo-nos ajustar a rota sempre que considerarmos necessário.

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