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Ainda somos as mesmas e vivemos como nossas mães.

Por Grayce Guglielmi Balod 09/11/2018 - 00:00 Atualizado em 09/11/2018 - 00:03

Observo que fica ofegante ao caminhar morro acima. Digo à ela que precisa se exercitar mais, fazer uma atividade física regularmente.

Seu medo de elevador me incomoda. Explico-lhe, como a uma criança, que não há o que temer. Mostro-lhe o que fazer caso fiquemos presas dentro dele.

Penso que sua organização é bagunçada e me antecipo em por no lugar o que tirou e tirar o que colocou.

Ela fala quando quero me concentrar. Fala quando quero ouvir outras falas. Ela fala em muitos momentos inapropriados, penso eu. Eu peço que espere, que tenha um pouco de paciência.

Ouço quando faz uma ligação para um irmão querido. Parece-me um monólogo, rápido, sem pausas, quase que sem tempo para respirar. Imito-a para que se ouça. Peço, sarcasticamente, que respire, tome um copo de água e ligue novamente para ouvir o que seu irmão tem a lhe dizer. Ela ri.

Olho para a foto que tiramos juntas e comento que a raiz de seu cabelo está entregando a verdadeira cor dos mesmos. 

Vejo que manda e pede notícias com muita frequência para o marido, filhos e netos. Digo-lhe que relaxe e deixe que eles a procurem.

Ela dá muitas voltas para me fazer um pedido. Sugiro que seja objetiva e diga o que quer exatamente, sem rodeios, dando-me o direito de responder sim ou não.

Salta-me aos olhos suas aflições, sua ansiedade, sua insegurança, seus medos, suas preocupações.

Vou dormir um pouco depois dela e acordo um pouco depois dela também. Se ajustássemos nossos horários, dormiríamos e acordaríamos na mesma hora. Temos necessidade da mesma quantidade de horas de sono. Nisso nós somos iguais.

Pela manhã e a tarde ela me observa.

A noite ela quebra o silêncio com uma afirmação serena e segura. Ela diz que meu dia é cheio e que eu ainda não me dei conta disso. Acrescenta, ainda, que educar os filhos, administrar uma casa, cuidar dos bichos de estimação, trabalhar e estudar é o suficiente.

Eu a ouço atentamente. 

Então eu a vejo e me vejo.

E me dou conta de que sou eu que preciso me exercitar mais. Que não tenho porque temer o elevador. Que minha bagunça é organizada e minha organização é bagunçada. Que sou tagarela. Que meus pensamentos atropelam minhas palavras quando quero expor meus sentimentos a alguém querido. Que está na hora de me decidir quanto ao que fazer com meus cabelos brancos. Que preciso ser mais objetiva. Que preciso dar espaço para que sintam minha falta. E que gostaria de dormir um pouco mais cedo para acordar um pouco mais cedo também.

Eu  imito seus comportamentos. Justamente os que menos gosto. E peço a ela que mude em si aquilo que eu quero mudar em mim.

Mas quando ela fala com propriedade e sapiência sobre mim eu simplesmente me calo e desfruto da paz de espírito advinda de ter o reconhecimento da pessoa na qual sempre me espelhei.

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