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Padre Agenor e Juiz Varella (3 de 3)

Por Henrique Packter 11/09/2023 - 08:50

O Aeroclube Albatroz possui 3 hangares, oferece oficina homologada para aeronaves experimentais e serviços de hangar. Waldir avisou: vamos descer e pousar! E foi o que fez, com grande perícia. Mal descemos, um empresário de sobrenome Raupp correu ao nosso encontro indagando como chegáramos a pousar ali. Não havia teto que possibilitasse a proeza!

Raupp, ao saber do que se tratava, orientou-nos sobre como chegar a Porto Alegre. As instruções eram todas de caráter visual, portanto o valente avião não poderia elevar-se, tornando a viagem bastante desconfortável. Mas, assim, chegamos a Porto Alegre, onde uma ambulância nos esperava. Levados à Santa Casa, fomos atendidos pelo Dr. Paglioli. Ele examinou o paciente e ao final do exame declarou que à primeira vista ele estava bem, que nada tinha. Pedi-lhe que visse seu fundo de olho. Foi o que fez e, sem nada dizer, ele mesmo empurrou maca e doente com rapidez para o centro cirúrgico. Lá, foi submetido a cirurgia para remoção de grande coágulo e contenção da hemorragia cerebral. Ele se restabeleceu, sem sequelas. 

VOLTANDO À VACA FRIA. O JOVEM EM ASFIXIA POR SEMENTE DE MELANCIA

Dois médicos atendiam e tinham residência em Urussanga na era de ouro de Padre Agenor e Varelinha. Eram eles Aldo Caruso Mac Donald (o mais antigo) e Raul do Nascimento Athayde da Rosa. Este sempre foi grande amigo meu, também formado em Curitiba na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Paraná. Raul formou-se em 1956. Ele foi colega de Edmundo Castilho, o fundador da Unimed no Brasil. De José Ramos May, irmão do Juiz em Criciúma, Francisco May Filho e depois desembargador em Florianópolis, Joubert Barros de Almeida (ORL em Lages), Luiz Fernando Bittencourt Beltrão (ORL em Joaçaba), o grande Kit Abdalla (brilhou intensamente no oeste do Paraná), Octávio Bessa   Júnior (da Laguna, teve notável carreira em cl& iacute;nica médica nos EUA), Paulo Dias Fernandes (Pablo Diaz Hernandes, contemporâneo meu em Santa Maria, RS; poeta, escritor e ORL radicado em Erechim), Thomaz Reis Mello (cirurgião, trabalhou sempre no Hospital São José de Criciúma, João Conrado Leal (anestesista do hospital São João Batista em Criciúma), Klaus Wolffenb:uttel (foi casado, por alguns meses, com nossa colega da turma 1959, Ayesha Batista), Francisco Ernesto Saboia (médico em Sombrio, SC, e já aposentado, plantonista no Hospital Regional São José), Doral Bomfim (ortopedista, professor de ortopedia).

Nas décadas de 1960 e 1970, quando o pároco de Urussanga era Padre Agenor Neves Marques e Minervina Bez Batti Simões tornara-se a primeira mulher a administrar o hospital mostrando coragem e determinação, o hospital de Urussanga ganhou grande reforma e ampliação. Novos equipamentos foram adquiridos e inaugurados novo centro cirúrgico, nova maternidade e nova pediatria.

MAIS UM RETORNO À VACA FRIA

Solicitado, Varelinha não titubeou: reúne os irmãos José e Aurélio Trento e Padre Agenor Neves Marques, inseparáveis amigos, para que iluminassem o irregular potreiro do Meneghel. Três automóveis seguiram para lá e se postaram estrategicamente em ambas as cabeceiras da improvisada pista. Varella e o arquejante menino ocupavam os dois únicos assentos do pequeno Paulistinha. Noite fechada. Ar pesado. Expectativa. Apreensão. Olhares preocupados. Contrariando tudo isso, ali estava o Rutinha, focinho ligeiramente empinado, ar arrogante, aguardando orgulhoso e impassível sua missão. Acionado o start, facho de fumaça-rica explodiu luminoso, expelido pelos escapamentos laterais. Sorte lançada: destino final: São Paulo. Sem iluminação alguma a não ser a tênue luz do painel a aeronave alçou voo e sumiu na densa escuridão.

Na lembrança dos que presenciaram a subida, ficou, por alguns minutos, o roncar firme exibindo a saúde do confiável motor Continental que equipava o valente PP-RUT, o Rutinha, como era chamado. Claro é que, ao invés de uma vida, a partir daquele momento extremo, vidas estavam em jogo com pequeno percentual de chance de sobrevivência para ambas. Nada difícil avaliar a gravidade do momento, daí a apreensão dos que ficaram, especialmente pelo que Varelinha representava. Na escuridão que se seguiu logo após a decolagem houve quem comentasse, a título de consolo, que, se o pior viesse a acontecer, Varella se despediria do mundo certamente como mais almejava: empunhando o manche de seu avião. Varella era mais que um simples piloto: era um mito da aviação civil no in terior do Brasil. Seu nome era uma lenda viva, tanto como aviador como magistrado. Era o Juiz alado. Tomou a rota marítima, guiado pelas constelações e eventuais cidades litorâneas que conhecia detalhadamente, até pelos escassos luminosos de néon que eventualmente possuíssem. Para abastecimento, programou o primeiro pouso em Florianópolis, onde não teve problemas devido à quase total ausência de fiscalização das autoridades aeroviárias naquela hora da noite. Abastecido, logo decola. Em Curitiba, após enfrentar violenta turbulência, comum na região do Vale do Itajaí, oficiais da aeronáutica civil já o aguardavam, alertados posteriormente à decolagem de Florianópolis, por alguém que não entendera o que acontecia e denunciara o piloto, via rádio. Ao descer no aeroporto Afonso Pena, em cujas proximidades, ano 1958, mo rreriam, Nereu Ramos, Leoberto Leal, Jorge Lacerda e Sidney Nocetti (quando da queda de um Convair 440 da Cruzeiro do Sul), Varella foi interceptado e ameaçado de detenção e de apresamento da aeronave. Identificou-se como juiz, o que de pouco adiantou. Então, implorou que lhe concedessem a oportunidade de salvar aquela vida. A vida de um adolescente que merecia viver e estava às portas da morte, no interior do avião. Um oficial checou a exígua cabina do Rutinha e a veracidade do que se dizia, permitindo a decolagem. Novos perigos na rota seguinte, em face de irregularidade geográfica do terreno que propiciava mais e violentas turbulências. Na noite cerrada, Varella sobrepujou a todos os percalços.

Quase manhã, pousava, ainda clandestinamente, no movimentado aeroporto de SP. De novo problemas com o controle de pousos e decolagens. Afinal, um penetra furara o movimentado espaço aéreo e burlara a lei, arriscando-se em meio a dezenas de aviões de carreira! Vem a ambulância e Varella passa as necessárias instruções aos paramédicos. O paciente, no centro cirúrgico hospitalar, passará por procedimento médico destinado à remoção de corpo estranho brônquico.  Varella, então, oferece as duas mãos para ser algemado e preso. Estendeu a chave de partida de seu avião. Voz embargada, teria dito: “Agora sim - prendam-me! Façam-no em nome da Lei”.

AGILMAR MACHADO ASSIM CONCLUI A NARRATIVA

Autoridades aeroportuárias, no episódio noturno, haviam passado à imprensa, informação de pequeno avião vindo clandestinamente do sul, pretendendo chegar a SP. À chegada de Varella, a imprensa invade o aeroporto. Sabendo dos motivos que o levaram àquela temerária aventura, tudo muda: a partir daquele momento, estava escrita, no honroso currículo de Newton Varella, uma das mais emocionantes histórias da vida de um piloto particular, de um homem de bem. Talvez o mais comovente registro da epopeia da longa trajetória de heroicos feitos da aviação civil deste país.

Esta singela homenagem tributada à figura de Newton Varella, é dedicada aos seus familiares, às memórias de João Pacheco dos Reis, o Pachequinho, Valdir Neves, Nelinho, Dego Orige, Aurélio, e José Trento; à sensibilidade do Monsenhor Agenor Neves Marques, a Adamastor Rocha, amigos inseparáveis de Varelinha, e, de forma especial ao Desembargador Newton Varela Filho e ao major paraquedista, Clavius Varella, irmão de Newton. A história da aviação civil, precursora no sul catarinense, registrará duas fases referenciais distintas. Tudo que se relaciona à aviação no sul, será ilegítimo se não se tomar como parâmetros básicos, dois únicos períodos: o que antecedeu e o que sucedeu à empolgante traje tória de Newton Varella.

Seus exemplos na arrojada forma de voar, no total desprendimento e na sempre presente solidariedade humana, são marcantes. Pena é que nossa memória em geral não busque guardar exemplos grandiosos como este e de tantos outros heróis, anônimos ou não, que passaram pela vida legando-nos assinalados e sábios ensinamentos! É pena...

Nossos respeitos, velho pintacuda e nobre Monsenhor, onde estiverem, sobrevoando ou não a imensidão do agora perene céu de brigadeiro. Lembremos do passado e nos certifiquemos, através deles e seus legados, do que é capaz a ousadia, a determinação e o amor por nossa terra. Ao Padre Agenor e ao Juiz Varella, nossa homenagem e respeito.

 MONSENHOR AGENOR NEVES MARQUES: MEU CLIENTE

Natural da Palhoça, como o governador Ivo Silveira, de quem era amigo. Sagrado padre em 29.12.1940, Tijucas/SC. Em 29.9.1947 está em Urussanga onde permanece até 2006 aos 91, quando morre. Pároco entre 1948 a 1987. Segundo Maestrelli (2019) era dono de oratória infernal, de improviso. Sacerdote-escritor, agricultor, aviador, acadêmico, padre, pai, pesquisador, poliglota, político, poeta, motoqueiro, radialista, rotariano, soldado, sociólogo, orador, escritor, pediatra, historiador, sacerdote, escritor (20). 

Em 1942 fundou a Casa da Criança de Criciúma, hoje Colégio São Bento. Já em Urussanga funda o Paraíso da Criança entregue às Irmãs Beneditinas e com capacidade para abrigar até 150 crianças. Funcionou 55 anos, sendo hoje Casa de Passagem.  Para manter essa instituição criou organismos como a Sociedade das Damas de Caridade, a Gráfica Paraíso, a Malharia – todas com objetivo de arrecadar fundos destinados àquela iniciativa.

Em 1951 fundou a Rádio Marconi, a voz de veludo (de tecido aveludado) ou a voz dos vinhedos, que, durante um ano funcionou na Igreja Matriz! Marconi, para homenagear o físico e inventor italiano Guglielmo Marconi (Bolonha, 25.4.1874-Roma, 20.7.1937).

Segundo Maestrelli o programa de rádio de Monsenhor teria o pretensioso nome de microfone de Deus, depois trocado para Andorinha Mensageira.Com a morte de Monsenhor, Rosa Miotello assumiu o programa que acontece todos os domingos e quando ele ocorria, desde 2.4.1975. O bispo da diocese compreendida na paróquia de Urussanga, não poucas querelas teve com Monsenhor. Era Dom Anselmo Pietrula e considerava ser sacrilégio expandir a palavra de Deus para fora da Igreja.

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