Ir para o Conteúdo da página Ir para o Menu da página
Carregando Dados...
FIQUE POR DENTRO DE TODAS AS INFORMAÇÕES DAS ELEIÇÕES 2024!
* as opiniões expressas neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do 4oito

Os pães de carrocinha, os peixes do Neném Gago e o pedinte trabalhador

Por Aderbal Machado 26/11/2022 - 07:00

Valério era o entregador de pão da Padaria Brasil, ou “Padaria do Zacaron”, como dizia papai. Os pães, entregues de casa em casa, eram acondicionados em um balaio forrado por um pano branco. 

Outros entregadores, desde as épocas dos anos 40, 50, até os anos 60 e quem sabe um bocadinho dos anos 70, faziam o serviço em carrocinhas envidraçadas, nas quais os pães ficavam visíveis. 

Tudo isso hoje é impossível, pelos cuidados da higiene pública e riscos de disseminação de doenças. Verdade, porém: naqueles tempos ninguém dava a mínima pra isso. Valia o conforto do pão na hora do café, novinho em folha e sem preocupações com sair de casa.

No Araranguá, peixes eram vendidos de carrinho de mão, de casa em casa ou em paradas estratégicas em pontos das ruas ou das praças. O mestre dessa arte era o Neném Gago, cujo nome verdadeiro jamais soube qual seja. 

Neném Gago era gago mesmo, não apenas um apelido. Acordava-se com seus gritos: “Olha o peixe; é bagre e não é tainha”. Ou “olha a tainha fresquinha”. Vendia tudo. 

Ah, sim: aqueles tempos eram também os tempos de comprar lenha cortadinha, transportada em carros de boi. Um dos vendedores era o Romário (vejam só!). Havia uma ligação próxima dele com nossa família. Ele foi grande parceiro do meu falecido irmão Adherbal e sofreu muito com sua morte. Acabou sendo praticamente adotado por papai, embora sem morar conosco. Tinha em papai um cliente fiel para comprar suas lenhas. Hoje isso também soa improvável, por razões óbvias. O progressismo,  necessário até na maioria dos casos, isolou esses romantismos e desafios econômicos.

A mana Icleia atendia, todos os sábados, um pedinte chamado Zezinho. Ele batia à sua porta sempre, porém sem pedir esmola. Queria trabalho e receber por isso. A dignidade do cidadão...

O chavão: “Bom dia, dona Icleia.  A senhora tem lenha pra eu picar?” Sempre tinha. E Zezinho só ia embora de café tomado e dinheirinho na mão. Cliente fixo.

Os tempos da lenha serviam ao uso dos chamados “fogões econômicos”, de ferro, substitutos dos velhos e notáveis fogões de tijolos e cimento, até hoje símbolos vivos da boa cozinha do interior. 

E agora, escrevendo isso daqui, fico matutanto: o modernismo foi MESMO um bom negócio?

Copyright © 2022.
Todos os direitos reservados ao Portal 4oito