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“Sei que fiz errado, mas minha alma está leve”, diz mulher que planejou a morte do próprio pai

Por trás do crime: os motivos que levaram Denise Bortoluzzi Della Bruna ao latrocínio do idoso Agenor Della Bruna
Por Francine Ferreira Criciúma - SC, 18/01/2019 - 07:11
História começou a se desenhar com a mãe de Denise, que sofreu violência doméstica durante 16 anos de casamento. Foto: Daniel Búrigo / A Tribuna
História começou a se desenhar com a mãe de Denise, que sofreu violência doméstica durante 16 anos de casamento. Foto: Daniel Búrigo / A Tribuna

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O que faz uma pessoa orquestrar a morte de outra? O que acontece para que, em uma situação como essa, seja a própria filha contribuindo para a morte do pai? No caso de Denise Bortoluzzi Della Bruna, de 34 anos, foi a história de vida da família que levou a diarista a cometer, com mais quatro comparsas, um latrocínio contra o idoso Agenor Della Bruna, de 69 anos, no último dia 9 de janeiro.

A Polícia Civil desvendou o crime menos de três dias depois do ocorrido e, em depoimento prestado ao delegado Jorge Giraldi no início desta semana, a filha confessou ter orquestrado a ação criminosa. A repercussão do caso foi intensa em todo o Sul catarinense e muitos fizeram a mesma pergunta: mas por quê?

Tudo começou há 45 anos, quando a mãe de Denise se casou, aos 16 anos, com Agenor. A união durou mais 16 anos e gerou cinco filhos, sendo um homem e quatro mulheres. Só que desde o início, registrou o mesmo problema: as agressões do marido contra a esposa e, à medida que os pequenos iam crescendo, contra as próprias crianças.

“Já em seguida, depois que casamos, começou a turbulência. Toda vida ele me agredindo, batia muito mesmo, até tem gente que pode servir de prova, que viam as marcas de facão nas costas das crianças. O que vinha na mão ele batia, seja facão, martelo, pedaço de pau de lenha, e em todos os filhos também”, conta a mãe de Denise.

Depois de 16 anos e por conta de diversos pedidos dos próprios filhos, ela resolveu sair de casa e pedir o divórcio. No dia em questão, lembra que o marido chegou a correr por praticamente um quilômetro atrás do filho com um facão, ameaçando matá-lo. Até que um vizinho o acolheu e escondeu no forro da própria casa para despistar o pai.

“Em seguida fui na delegacia de Içara prestar queixa. Só que quando voltei com dois policiais, ele disse que eu era culpada, e como esses policiais eram amigos do meu marido, não me deram apoio. Existiam as leis, mas infelizmente elas não eram cumpridas, eu só recebi não na minha vida quando tentei buscar ajuda. Ainda assim, peguei um táxi e fui para a casa dos meus pais, me separei e criei todos os meus filhos sozinha. Quando eu vim embora, não dormia com medo de ele vir à noite me atacar. Depois o tempo foi passando e ele chegou a ficar cinco anos sem ver as crianças, nunca ajudou na criação e nem nos falávamos”, acrescenta a mãe.

Uma tia avó de Denise também confirma a história e assegura que a sobrinha só saiu de casa quando não aguentava mais apanhar do marido. “Ela passou muito trabalho, desde que casou ele judiava dela. Quando veio para a casa dos pais tinha apanhado tanto, que precisou ser até internada. Depois que voltou sempre trabalhou, junto com os filhos mais velhos, quando recebeu sua parte do divórcio comprou a casa onde mora até hoje e assim criou as crianças”, conclui.

Tamanho trauma, a mulher conseguiu iniciar um novo relacionamento apenas 28 anos depois do divórcio. Ainda assim, namorando há aproximadamente três anos, confessa que, mesmo depois de todo esse tempo, ainda tinha receio de que o idoso pudesse tentar lhe fazer algum mal.

Uma mágoa guardada há anos

Apesar de ser a mais nova e, consequentemente, a que menos apanhou do pai, Denise alega que desde pequena guardou uma grande mágoa de Agenor. “Ninguém sabe o que a gente passou, minha irmã mais velha conta que tinha doze anos e via a mãe apanhando de corrente, ficava um gelo e queria avançar no pai, mas ele dizia que se ela tentasse, também apanharia. Além disso, do meu pai eu tenho somente duas imagens de quando era pequena: eu com três anos, apanhando no chão até me mijar, com ele me batendo de cinta; e meu irmão correndo pela roça com meu pai atrás dele empunhando um facão, ameaçando matá-lo”, recorda.

Ela ainda lembra que os irmãos chegaram a passar por dificuldades financeiras já quando adultos, pediram auxílio para o pai e receberam uma negativa como resposta. Apenas recentemente é que o idoso havia recebido uma herança e distribuído certa quantia para os cinco filhos. “Ele nunca demonstrou interesse, queria que a gente se humilhasse e dizia que nos daria dinheiro se levássemos nossos filhos para ver ele. E até hoje dizia que a mãe era errada, uma vagabunda, por ter se divorciado dele e namorado de novo”, completa.

Trabalhando atualmente como faxineira, Denise também criou quatro filhos praticamente sozinha. Foi casada por 16 anos, mas o esposo, que era usuário de drogas, acabou detido. “Muitas vezes eu brigava com meu ex-marido, mas nunca na frente das crianças, porque é uma coisa que fica pelo resto da vida na cabeça, a gente não esquece. Eu era muito pequena, tinha apenas três anos, mas lembro muito bem do que a minha mãe passava”, ressalta.

A tia avó de Denise afirma que ela também não teve sorte com o marido. “Ele não trabalhava, se envolveu com drogas e agora está preso em Lages. Como ela vivia longe, nunca cheguei a conversar com ela sobre o pai, mas mesmo assim não entendemos porque fez isso. Talvez sempre quis um pai mais presente e nunca teve”, acrescenta.

Sem arrependimentos

Nos últimos tempos, Denise alega que passou por duas decepções em relacionamentos e que, logo depois disso, acabou decidindo orquestrar a ação criminosa contra o pai. “Acho que foi a hora, fazia mais de um ano que não via ele. Aquela revolta foi crescendo e acabou nisso, não vou conseguir explicar como. Pra quem não conhece a história é fácil julgar, mas não me importo com o que os outros falam. Na rua todo mundo dizia que meu pai era um homem maravilhoso, mas na verdade ele era um monstro. Queria que essas pessoas ficassem um dia só junto com a mãe, quando ela apanhava”, critica.

A filha ainda frisa que parentes do pai prometeram testemunhar em seu futuro julgamento, para confirmar a história de vida da família e as atitudes de Agenor. “Não concordo em tirar a vida de alguém, sei que fiz errado e vou pagar pelos meus atos. Mas minha alma está leve, não tenho mais raiva de ninguém. Pode ser que um dia eu me arrependa, mas hoje, a única coisa da qual eu me arrependo é por ter feito a minha família sofrer. Eles não aceitam, mas entendem, meus irmãos ficaram todos do meu lado, porque sabem o que sofreram”, reforça.

“Se fosse perguntar se eu faria de novo, digo que até poderia fazer, mas não com essa gravidade. Naquela hora eu estava com muita raiva e não pensei em ninguém, mas hoje eu vejo que vou ficar um bom tempo presa e meus filhos vão ficar por ai. Claro que a minha mãe vai cuidar deles, mas são meus filhos e vão sentir falta da própria mãe. Por isso, talvez se pensasse novamente não faria, mas ai ficaria sempre com aquela raiva, que agora passou”, avalia.

Sobre tentar fugir, Denise afirma que teve a oportunidade de sair do Brasil logo depois do latrocínio, mas que recusou e decidiu se apresentar à Polícia Civil, para posteriormente ser julgada e pagar pelo crime que cometeu.

“Não aceito, mas entendo”

Ao descobrir o que a filha havia feito, a mãe de Denise relata que se sentiu em um filme de terror. “Perdi o chão. No dia que vieram me falar sobre a morte o meu coração foi direto para a casa dela, me veio ela na cabeça e não conseguia dizer pra ninguém. Também não conseguia entrar em contato com ela e logo deduzi que estaria envolvida, porque sempre dizia que tinha essa revolta. Não imaginava que era algo tão grande, pensava que ia superar. Ai quando recebi a confirmação fiquei arrasada e só depois comecei a me acalmar. Não aceito o que ela fez, mas entendo”, finaliza.

A Polícia Civil aguarda decisão do Poder Judiciário, a respeito do pedido de prisão preventiva contra Denise, para, então, prendê-la.

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