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Comum não é normal

Conheça as armadilhas do método "perder para aprender" de cursos de investimento
Por Arthur Lessa Edição 08/07/2022

Nunca vi nenhum curso (tutorial, workshop, videoaula,...) de gastronomia que oriente o aprendiz a comprar 10kg de filé mignon e ir tentando acertar a o ponto da carne até dar certo. Se ainda não deu certo, mais 10kg pra treinar. O prejuízo inicial faz parte. “Você tem que perder pra aprender a ganhar”.

O exemplo acima, mesmo esdrúxulo, faz mais sentido do que o que é dito por muitos influenciadores que ganham a vida vendendo cursos de como ficar rico rápido operando no mercado financeiro. Com a carne, as variáveis são o cozinheiro, a carne, a frigideira e o fogão. É possível controlar tudo, então a prática vai levando à habilidade. A carne sempre chegará ao ponto desejado na temperatura X após Y minutos.

O mercado financeiro, por outro lado, envolve pessoas. Milhares delas. Comprando e vendendo ativos de acordo com suas convicções, estratégias, emoções e, invariavelmente, notícias e percepções do que deve acontecer no futuro. Não há a mínima possibilidade de uma pessoa controlar o fluxo. Nem Elon Musk, e suas bombásticas tuitadas jogando o valor do Bitcoin para cima e para baixo, tem controle total de mercado algum.

Há na área de estudos sobre investimentos alguns ditados, bastante batidos, que tratam dessa força chamada “O Mercado”. Um dos mais difundidos, com o qual concordo plenamente, afirma que o Mercado é soberano. O é porque se move como uma onda, tem sua força própria, que impulsiona o fluxo para cima ou para baixo. Ninguém o controla, ao mesmo tempo em que todos o controlam, já que tal fluxo é impulsionado pela média de todas as ordens de compra com todas as ordens de venda vigentes naquele momento.

Um segundo o define como “irracional”, levando em conta principalmente os movimentos de manada, quando uma ação pode sofrer uma grande valorização ou desvalorização, sem que a empresa que esta representa tenha sofrido alteração alguma em seu resultado ou financiamento. Benjamin Graham, no livro O Investidor Inteligente, faz uma metáfora personificando um Sr Mercado, que “todo dia, dependendo de seus sonhos ou medos, ele faz ofertas às nossas ações”. Ora ele está eufórico e quer compra-las a preços acima da média, ora está depressivo e quer vendê-las a preço de banana.

Há um terceiro a ser citado, mais questionável (eu mesmo vejo com desconfiança), é que o mercado é eficiente. Tal afirmação se confirma com mais frequência na medida que o prazo de análise se alonga. O contrário segue a mesma lógica, com os movimentos do mercado sendo mais imprevisíveis na medida em que o prazo de análise é mais curta. Citando de novo Graham, “a curto prazo o mercado é uma máquina de votação, mas, a longo prazo, o mercado é uma balança”.

Seguindo o que já é praxe nos conteúdos de investimento nas redes sociais, deixo claro que o que escrevo aqui é a minha visão sobre o assunto.

Agora, tendo isso posto, vamos pensar de novo no início do texto. Não faz sentido, né?

Não tenho aqui o objetivo de “pregar” contra o as operações de curto prazo em índice, dólar, forex e afins. Eu mesmo operar vez ou outra e sei que há técnicas e padrões nesse mercado. O ponto que quero chamar atenção é que pode ser comum, infelizmente, que muitas pessoas tenham frequentes prejuízos nas primeiras operações de daytrade. Mas não faz sentido entender que isso é “parte do processo”. Comum não é sinônimo de normal.

Tal discurso pode encobrir, o que acontece com muita frequência, a ineficiência de um curso de R$ 2 mil, R$ 5 mil ou 10 mil que promete coisas como, pasmem, lucro de centenas de dólares em dois cliques no semáforo.

Por fim, deixo duas reflexões:

1 - O melhor jeito de ganhar dinheiro rápido é vender cursos de como enriquecer rápido.

2 – Se alguém descobrisse um jeito garantido de ganhar 20% de rendimento ao mês, ia guardar o segredo pra si ou divulgá-lo em cursos e livros?

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